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Bruna Frascolla
September 14, 2024
© Photo: REUTERS/Eduardo Munoz

Escreva para nós: info@strategic-culture.su

Seja em sua ala de direita ou de esquerda, o assim chamado Ocidente tem se empenhado em mostrar que só ele defende as mulheres. Enquanto a direita tece loas às liberdades da Revolução Sexual e da Contracultura (que até ontem eram de esquerda), a esquerda insiste em manter o livre direito ao aborto como um direito inalienável que separa barbárie de civilização. Neste último caso, usa-se O Conto da Aia, da feminista Margaret Atwood, como bicho-papão. Isso significaria que as mulheres férteis são transformadas em parideiras, sem liberdade de escolha.

Eu já havia percebido que a propaganda ocidental visa a apavorar judeus e homossexuais, fazendo-os crer que, sem a tutela dos EUA, todos os judeus e todos os homossexuais do mundo serão assassinados por hordas de antissemitas e de homofóbicos. Há pouco eu percebi que a mesma lenga-lenga está sendo empurrada às mulheres. No X, aparecia para mim um monte de postagens mostrando o que supostamente acontece com as mulheres onde os muçulmanos predominam: fica todo o mundo de burca. Assim, eu deveria apoiar a causa sionista em particular porque eles representam os valores ocidentais em geral. Se não defenderem o Ocidente, as mulheres ocidentais, acostumadas à liberdade, passarão à condição de escravas reprodutoras, que andam cobertas da cabeça aos pés porque só podem ser vistas pelo marido – um barbudo que não é hipster.

Na verdade, o local onde as mulheres ocidentais deveriam temer a possibilidade de virarem escravas parideiras é o Ocidente. É o Ocidente quem prega (1) a comodificação de tudo o que for possível e (2) a absoluta igualdade entre os sexos. Essa igualdade é tão grande que, sendo o sexo indiferente para o casamento, o casal, mesmo sendo composto por dois homens, se sente no direito de ter pelo menos um filho biológico. Se casais heterossexuais têm filhos biológicos, seria uma discriminação intolerável que os casais homossexuais compostos por dois machos da espécie não pudessem ter também. O problema de homens não produzirem óvulos nem terem útero é resolvido comprando um óvulo e alugando uma barriga. O óvulo e a barriga podem ser da mesma mulher ou não.

A coisa toda é arriscada para a mulher e para a vida nova. A mulher precisa usar Lupron (o mesmo medicamento usado para castrar pedófilos e “crianças trans”), depois precisa se entupir de hormônios artificiais. Por óbvio, ninguém sabe os efeitos de longo prazo disso, já que é uma novidade. O que se sabe é que é mais fácil a mulher manter uma gravidez feita com o próprio óvulo do que segurar um organismo que lhe é totalmente estranho.

Num caso anônimo na Inglaterra (do qual a feminista Julie Bindel trouxe maiores detalhes), um casal gay queria muito ter um filho e, de alguma maneira, fez com que a irmã de uma amiga aceitasse servir como barrida de aluguel. Como a gravidez não ia adiante com um óvulo de outra mulher, acabou sendo com o dela mesma. Durante a gravidez, houve desentendimentos com o casal porque ela temia que eles não a deixassem ver o filho. Ainda assim, ela cumpriu o combinado. Depois, os seus temores se confirmaram: eles ameaçaram chamar a polícia quando ela foi visitar o bebê e o caso foi parar na justiça. O casal alegava – corretamente, segundo os parâmetros morais do Ocidente – que era homofobia presumir que toda família tivesse uma mãe. A função de pais era ocupada por dois homens, e presumir que uma criança devesse ter uma mãe era uma discriminação contra a comunidade LGBT.

Assim, feministas radicais e ativistas conservadoras comemoraram a decisão da justiça inglesa que, neste mês, deu direito à mãe de visitar o filho. É uma “landmark decision”, que abre precedente para outras.

Sem dúvida é importante, mas isso apenas igualou a Inglaterra aos EUA. O casal gay, mesmo sendo dono de uma agência de barrigas de aluguel, correu um risco atípico ao resolver as coisas de modo caseiro e doméstico. Como muito bem mostrou a mesma Julie Bindel neste artigo, o mercado de gametas e de barrigas de aluguel é muito globalizado. Tipicamente, os ricos alugam barrigas de mulheres pobres do terceiro mundo ou da Califórnia, que, além de terem a legislação precária ou conivente, jamais teriam como acionar a justiça em outro país.

Nos EUA, o aluguel de barrigas corria solto até o caso da Baby M., que também era filha biológica da barriga de aluguel. Em 1988, a Suprema Corte de Nova Jérsei decidiu que nenhuma mãe deveria ser obrigada, por contrato, a entregar o filho – mas decidiu também que a criança deveria ficar com o pai biológico e ser adotada por sua esposa, cortando o contato com a mãe. Em 1990, porém, a Suprema Corte da Califórnia decidiu em sentido contrário, mas no caso a barriga de aluguel não era dona do óvulo. Na prática, isso acabou criando uma reserva de mercado para clínicas e agências, porque é muito fácil inseminar uma mulher fértil e ninguém precisa de uma clínica para isso. Já pegar um embrião pronto e implantá-lo numa mulher diferente, são outros quinhentos.

É isso, não os delírios de islamização forçada, que as mulheres ocidentais devem temer. Sobretudo as da periferia do Ocidente. Bem sabemos que no livre mercado há coerção econômica. As crianças pobres só deixaram de ser praticamente obrigadas a trabalhar quando o capitalismo ganhou freios. Como esses freios estão se perdendo e a ciência está avançando junto com a desigualdade econômica, o medo das mulheres ocidentais deveria ser o de ter que vender o corpo da maneira mais invasiva possível: gestando um filho que ela nunca mais poderá ver e do qual não poderá ter notícias. A Colômbia e o México já estão integrados nesse comércio global. E é isso, não a proibição do aborto, que faz com que o Ocidente se assemelhe à distopia de Atwood.

As mulheres devem temer o Ocidente LGBT, não o Oriente muçulmano

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Seja em sua ala de direita ou de esquerda, o assim chamado Ocidente tem se empenhado em mostrar que só ele defende as mulheres. Enquanto a direita tece loas às liberdades da Revolução Sexual e da Contracultura (que até ontem eram de esquerda), a esquerda insiste em manter o livre direito ao aborto como um direito inalienável que separa barbárie de civilização. Neste último caso, usa-se O Conto da Aia, da feminista Margaret Atwood, como bicho-papão. Isso significaria que as mulheres férteis são transformadas em parideiras, sem liberdade de escolha.

Eu já havia percebido que a propaganda ocidental visa a apavorar judeus e homossexuais, fazendo-os crer que, sem a tutela dos EUA, todos os judeus e todos os homossexuais do mundo serão assassinados por hordas de antissemitas e de homofóbicos. Há pouco eu percebi que a mesma lenga-lenga está sendo empurrada às mulheres. No X, aparecia para mim um monte de postagens mostrando o que supostamente acontece com as mulheres onde os muçulmanos predominam: fica todo o mundo de burca. Assim, eu deveria apoiar a causa sionista em particular porque eles representam os valores ocidentais em geral. Se não defenderem o Ocidente, as mulheres ocidentais, acostumadas à liberdade, passarão à condição de escravas reprodutoras, que andam cobertas da cabeça aos pés porque só podem ser vistas pelo marido – um barbudo que não é hipster.

Na verdade, o local onde as mulheres ocidentais deveriam temer a possibilidade de virarem escravas parideiras é o Ocidente. É o Ocidente quem prega (1) a comodificação de tudo o que for possível e (2) a absoluta igualdade entre os sexos. Essa igualdade é tão grande que, sendo o sexo indiferente para o casamento, o casal, mesmo sendo composto por dois homens, se sente no direito de ter pelo menos um filho biológico. Se casais heterossexuais têm filhos biológicos, seria uma discriminação intolerável que os casais homossexuais compostos por dois machos da espécie não pudessem ter também. O problema de homens não produzirem óvulos nem terem útero é resolvido comprando um óvulo e alugando uma barriga. O óvulo e a barriga podem ser da mesma mulher ou não.

A coisa toda é arriscada para a mulher e para a vida nova. A mulher precisa usar Lupron (o mesmo medicamento usado para castrar pedófilos e “crianças trans”), depois precisa se entupir de hormônios artificiais. Por óbvio, ninguém sabe os efeitos de longo prazo disso, já que é uma novidade. O que se sabe é que é mais fácil a mulher manter uma gravidez feita com o próprio óvulo do que segurar um organismo que lhe é totalmente estranho.

Num caso anônimo na Inglaterra (do qual a feminista Julie Bindel trouxe maiores detalhes), um casal gay queria muito ter um filho e, de alguma maneira, fez com que a irmã de uma amiga aceitasse servir como barrida de aluguel. Como a gravidez não ia adiante com um óvulo de outra mulher, acabou sendo com o dela mesma. Durante a gravidez, houve desentendimentos com o casal porque ela temia que eles não a deixassem ver o filho. Ainda assim, ela cumpriu o combinado. Depois, os seus temores se confirmaram: eles ameaçaram chamar a polícia quando ela foi visitar o bebê e o caso foi parar na justiça. O casal alegava – corretamente, segundo os parâmetros morais do Ocidente – que era homofobia presumir que toda família tivesse uma mãe. A função de pais era ocupada por dois homens, e presumir que uma criança devesse ter uma mãe era uma discriminação contra a comunidade LGBT.

Assim, feministas radicais e ativistas conservadoras comemoraram a decisão da justiça inglesa que, neste mês, deu direito à mãe de visitar o filho. É uma “landmark decision”, que abre precedente para outras.

Sem dúvida é importante, mas isso apenas igualou a Inglaterra aos EUA. O casal gay, mesmo sendo dono de uma agência de barrigas de aluguel, correu um risco atípico ao resolver as coisas de modo caseiro e doméstico. Como muito bem mostrou a mesma Julie Bindel neste artigo, o mercado de gametas e de barrigas de aluguel é muito globalizado. Tipicamente, os ricos alugam barrigas de mulheres pobres do terceiro mundo ou da Califórnia, que, além de terem a legislação precária ou conivente, jamais teriam como acionar a justiça em outro país.

Nos EUA, o aluguel de barrigas corria solto até o caso da Baby M., que também era filha biológica da barriga de aluguel. Em 1988, a Suprema Corte de Nova Jérsei decidiu que nenhuma mãe deveria ser obrigada, por contrato, a entregar o filho – mas decidiu também que a criança deveria ficar com o pai biológico e ser adotada por sua esposa, cortando o contato com a mãe. Em 1990, porém, a Suprema Corte da Califórnia decidiu em sentido contrário, mas no caso a barriga de aluguel não era dona do óvulo. Na prática, isso acabou criando uma reserva de mercado para clínicas e agências, porque é muito fácil inseminar uma mulher fértil e ninguém precisa de uma clínica para isso. Já pegar um embrião pronto e implantá-lo numa mulher diferente, são outros quinhentos.

É isso, não os delírios de islamização forçada, que as mulheres ocidentais devem temer. Sobretudo as da periferia do Ocidente. Bem sabemos que no livre mercado há coerção econômica. As crianças pobres só deixaram de ser praticamente obrigadas a trabalhar quando o capitalismo ganhou freios. Como esses freios estão se perdendo e a ciência está avançando junto com a desigualdade econômica, o medo das mulheres ocidentais deveria ser o de ter que vender o corpo da maneira mais invasiva possível: gestando um filho que ela nunca mais poderá ver e do qual não poderá ter notícias. A Colômbia e o México já estão integrados nesse comércio global. E é isso, não a proibição do aborto, que faz com que o Ocidente se assemelhe à distopia de Atwood.

Escreva para nós: info@strategic-culture.su

Seja em sua ala de direita ou de esquerda, o assim chamado Ocidente tem se empenhado em mostrar que só ele defende as mulheres. Enquanto a direita tece loas às liberdades da Revolução Sexual e da Contracultura (que até ontem eram de esquerda), a esquerda insiste em manter o livre direito ao aborto como um direito inalienável que separa barbárie de civilização. Neste último caso, usa-se O Conto da Aia, da feminista Margaret Atwood, como bicho-papão. Isso significaria que as mulheres férteis são transformadas em parideiras, sem liberdade de escolha.

Eu já havia percebido que a propaganda ocidental visa a apavorar judeus e homossexuais, fazendo-os crer que, sem a tutela dos EUA, todos os judeus e todos os homossexuais do mundo serão assassinados por hordas de antissemitas e de homofóbicos. Há pouco eu percebi que a mesma lenga-lenga está sendo empurrada às mulheres. No X, aparecia para mim um monte de postagens mostrando o que supostamente acontece com as mulheres onde os muçulmanos predominam: fica todo o mundo de burca. Assim, eu deveria apoiar a causa sionista em particular porque eles representam os valores ocidentais em geral. Se não defenderem o Ocidente, as mulheres ocidentais, acostumadas à liberdade, passarão à condição de escravas reprodutoras, que andam cobertas da cabeça aos pés porque só podem ser vistas pelo marido – um barbudo que não é hipster.

Na verdade, o local onde as mulheres ocidentais deveriam temer a possibilidade de virarem escravas parideiras é o Ocidente. É o Ocidente quem prega (1) a comodificação de tudo o que for possível e (2) a absoluta igualdade entre os sexos. Essa igualdade é tão grande que, sendo o sexo indiferente para o casamento, o casal, mesmo sendo composto por dois homens, se sente no direito de ter pelo menos um filho biológico. Se casais heterossexuais têm filhos biológicos, seria uma discriminação intolerável que os casais homossexuais compostos por dois machos da espécie não pudessem ter também. O problema de homens não produzirem óvulos nem terem útero é resolvido comprando um óvulo e alugando uma barriga. O óvulo e a barriga podem ser da mesma mulher ou não.

A coisa toda é arriscada para a mulher e para a vida nova. A mulher precisa usar Lupron (o mesmo medicamento usado para castrar pedófilos e “crianças trans”), depois precisa se entupir de hormônios artificiais. Por óbvio, ninguém sabe os efeitos de longo prazo disso, já que é uma novidade. O que se sabe é que é mais fácil a mulher manter uma gravidez feita com o próprio óvulo do que segurar um organismo que lhe é totalmente estranho.

Num caso anônimo na Inglaterra (do qual a feminista Julie Bindel trouxe maiores detalhes), um casal gay queria muito ter um filho e, de alguma maneira, fez com que a irmã de uma amiga aceitasse servir como barrida de aluguel. Como a gravidez não ia adiante com um óvulo de outra mulher, acabou sendo com o dela mesma. Durante a gravidez, houve desentendimentos com o casal porque ela temia que eles não a deixassem ver o filho. Ainda assim, ela cumpriu o combinado. Depois, os seus temores se confirmaram: eles ameaçaram chamar a polícia quando ela foi visitar o bebê e o caso foi parar na justiça. O casal alegava – corretamente, segundo os parâmetros morais do Ocidente – que era homofobia presumir que toda família tivesse uma mãe. A função de pais era ocupada por dois homens, e presumir que uma criança devesse ter uma mãe era uma discriminação contra a comunidade LGBT.

Assim, feministas radicais e ativistas conservadoras comemoraram a decisão da justiça inglesa que, neste mês, deu direito à mãe de visitar o filho. É uma “landmark decision”, que abre precedente para outras.

Sem dúvida é importante, mas isso apenas igualou a Inglaterra aos EUA. O casal gay, mesmo sendo dono de uma agência de barrigas de aluguel, correu um risco atípico ao resolver as coisas de modo caseiro e doméstico. Como muito bem mostrou a mesma Julie Bindel neste artigo, o mercado de gametas e de barrigas de aluguel é muito globalizado. Tipicamente, os ricos alugam barrigas de mulheres pobres do terceiro mundo ou da Califórnia, que, além de terem a legislação precária ou conivente, jamais teriam como acionar a justiça em outro país.

Nos EUA, o aluguel de barrigas corria solto até o caso da Baby M., que também era filha biológica da barriga de aluguel. Em 1988, a Suprema Corte de Nova Jérsei decidiu que nenhuma mãe deveria ser obrigada, por contrato, a entregar o filho – mas decidiu também que a criança deveria ficar com o pai biológico e ser adotada por sua esposa, cortando o contato com a mãe. Em 1990, porém, a Suprema Corte da Califórnia decidiu em sentido contrário, mas no caso a barriga de aluguel não era dona do óvulo. Na prática, isso acabou criando uma reserva de mercado para clínicas e agências, porque é muito fácil inseminar uma mulher fértil e ninguém precisa de uma clínica para isso. Já pegar um embrião pronto e implantá-lo numa mulher diferente, são outros quinhentos.

É isso, não os delírios de islamização forçada, que as mulheres ocidentais devem temer. Sobretudo as da periferia do Ocidente. Bem sabemos que no livre mercado há coerção econômica. As crianças pobres só deixaram de ser praticamente obrigadas a trabalhar quando o capitalismo ganhou freios. Como esses freios estão se perdendo e a ciência está avançando junto com a desigualdade econômica, o medo das mulheres ocidentais deveria ser o de ter que vender o corpo da maneira mais invasiva possível: gestando um filho que ela nunca mais poderá ver e do qual não poderá ter notícias. A Colômbia e o México já estão integrados nesse comércio global. E é isso, não a proibição do aborto, que faz com que o Ocidente se assemelhe à distopia de Atwood.

The views of individual contributors do not necessarily represent those of the Strategic Culture Foundation.

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