O caso permanece relevante porque ele hoje é instrumentalizado pelo governo de Javier Milei em sua aproximação com o Estado de Israel
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No dia 18 de julho de 1994, pela manhã, explodiu uma bomba na sede da Associação de Mutuários Israelitas Argentinos, no centro de Buenos Aires, levando abaixo o prédio e causando a morte de 85 pessoas, com mais de 300 ficando feridas.
O atentado ocorreu 2 anos depois do ataque à embaixada israelense na Argentina, que deixou 22 mortos e 242 feridos. Ambos atentados deram-se quando o país era governado por Carlos Menem, um governo impactante para a Argentina por representar um período de transição para o neoliberalismo, com privatizações em massa e a parcial dolarização da economia.
Mas no plano geopolítico o governo Menem é mais recordado pela aparente “guerra secreta” que se desenrolou dentro do país, envolvendo agências de inteligência e grupos subversivos de vários países.
A versão mais popular do Caso AMIA diz o seguinte: Para se vingar do rompimento do acordo de transferência nuclear entre a Argentina e o Irã, o governo iraniano (à época sob o Presidente Akbar Rafsanjani) planejou um ato de vingança, cujos executores seriam membros do partido libanês Hezbollah.
Essa narrativa, transformada em “versão oficial”, esteve apoiada em relatórios dos serviços de inteligência dos EUA e de Israel, e levou à categorização do Hezbollah como grupo terrorista pelo governo argentino, bem como a uma quebra das outrora amistosas relações entre Argentina e Irã.
Mas e se essa versão popular estiver errada?
Recentemente, um ex-funcionário do juiz Juan José Galeano – responsável pela condução do inquérito e do processo entre 1994 e 2005 – revelou detalhes que põem em dúvida a versão consagrada. Segundo Claudio Lifschitz, ex-assistente de Galeano e ex-membro do serviço de segurança da Argentina não foi realmente encontrada qualquer prova vinculando o governo iraniano ao atentado. Ao contrário, segundo Lifschitz, as evidências cada vez mais apontavam na direção de elementos do serviço de inteligência argentino, o SIDE.
Lifschitz aparece neste caso de forma pública pela primeira vez quando ele revelou uma gravação em vídeo de uma reunião entre Galeano e Carlos Telleldín, em que o juiz oferece dinheiro ao suposto fornecedor do carro usado no atentado para que ele confessasse ter vendido o automóvel ao adido cultural da Embaixada Iraniana em Buenos Aires Mohsen Rabbani. Segundo Lifschitz, um dos principais elementos que podem exonerar o Irã de participação nesse atentado seria o fato de que o SIDE havia grampeado ilegalmente, sem ordem judicial, a Embaixada do Irã e o Centro Cultural Iraniano em Buenos Aires, dispondo de milhares de horas de gravações, sem qualquer indício de que qualquer iraniano que frequentava esses espaços sabia de qualquer informação do atentado.
O verdadeiro responsável, de acordo com Lifschitz, teria sido Jaime Stiuso, chefe-adjunto do setor de contraespionagem da SIDE – a “Seção 85” – e encarregado das investigações de inteligência do Caso AMIA. Segundo Lifschitz, Telleldín teria, na verdade, vendido o carro usado no atentado a um agente da SIDE. Ademais, Stiuso – que possuía boas relações com o Mossad e a CIA – teria sido o responsável pela construção da acusação feita pelo procurador Albert Nisman à Presidente Cristina Kirchner de que ela teria tentado acobertar a participação iraniana no caso.
O ex-agente da inteligência argentina afirma que teria ouvido do próprio Stiuso que o Mossad era o mentor por trás dos atentados, ainda que seja difícil comprovar que essa conversa entre ambos realmente ocorreu.
O caso permanece relevante, porém, porque ele hoje é instrumentalizado pelo governo de Javier Milei em sua aproximação com o Estado de Israel, a ponto do presidente argentino categorizar o Irã como “país inimigo da Argentina”.