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Eduardo Vasco
August 15, 2025
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O Painel fez mais de uma reunião com o governo da Coreia do Sul em Seul, bem como com o governo japonês em Tóquio.

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Neste segundo artigo da série sobre os painéis de especialistas do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre a República Popular Democrática da Coreia, analisaremos a atuação da equipe que elaborou o segundo relatório sobre as supostas violações das sanções ao programa nuclear por parte de Pyongyang. Assim como o primeiro Painel, veremos que este também foi formado por funcionários dos governos de países hostis à RPDC, ou ao menos pessoas de confiança do imperialismo americano para atuar contra a Coreia.

Em 7 de junho de 2010, o Conselho de Segurança estendeu o mandato do Painel de Especialistas até 12 de junho de 2011. Em outubro de 2010, Ban Ki-moon informou à presidência do Conselho de Segurança que Asada e Comras haviam decidido deixar a equipe de especialistas e apontou o japonês Takehiro Yamamoto para o lugar de Asada nas questões nucleares e o norte-americano George Lopez para o lugar de Comras nos assuntos financeiros [1]. Em dezembro, o britânico David J. Birch também decidiu deixar o Painel. Vejamos, por exemplo, quem é George Lopez. Trata-se de um “intelectual orgânico” do Estado norte-americano, tendo assumido posições de liderança em instituições estatais, como o United States Institute of Peace (USIP), e aconselhado o Departamento de Estado [2]. Com efeito, os artigos publicados por Lopez na imprensa sobre a RPDC geralmente buscam orientar a política dos Estados no sentido de aprofundar o regime de sanções contra o país asiático. Ele já pediu publicamente para que o governo americano “leve o regime à falência”, rotulando a RPDC de “império criminoso”, “cleptocracia criminosa” e “governo clientelista corrupto”. “Até que nós estrangulemos esse sistema, não seremos capazes de bloquear seu programa nuclear ou de mísseis”, segundo ele [3].

Após o término do primeiro mandato estendido do Painel de Especialistas, em 12 de junho de 2011, Ban Ki-moon apontou os integrantes do segundo Painel: John Everard para as questões regionais (representando o Reino Unido), George A. Lopez para as questões financeiras (representando os EUA), Eric Marzolf para a questão da tecnologia de mísseis (representando a França), Duk Ho Moon para o tema da proliferação de armas de destruição em massa (representando a Coreia do Sul), Alexander Vilnin para os temas de alfândega (representando a Rússia), Xiaodong Xue para o controle de exportações e materiais nucleares (representando a China) e Takehiko Yamamoto para as questões nucleares (representando o Japão) [4].

John Everard, coordenador do Painel, era um experiente diplomata, tendo inclusive servido como embaixador do Reino Unido em Pyongyang por cerca de três anos [5]. Evidentemente defensor das sanções contra a RPDC, lamentou posteriormente o fim do Painel de Especialistas, mas acabou admitindo que a membresia no painel “era determinada mais pela nacionalidade do que pelas habilidades” dos pretensos especialistas [6] – ou seja, sua natureza era muito mais política do que técnica. Duk Ho Moon, por sua vez, é membro do serviço diplomático da Coreia do Sul desde 1987, tendo trabalhado na Ásia, Europa e EUA [7].

Posteriormente, George A. Lopez e Takehiko Yamamoto foram substituídos por William J. Newcomb (em setembro de 2011) e Katsuhisa Furukawa (em outubro de 2011), respectivamente. Funcionário de carreira do governo dos EUA, Newcomb já havia trabalhado no Departamento de Estado e no Departamento do Tesouro [8]. O novo representante do Japão, por sua vez, é ligado tanto ao governo japonês como ao estadunidense, tendo estudado em Harvard e trabalhado inclusive no Conselho de Relações Exteriores dos EUA [9].

Em 14 de junho de 2012, o Painel de Especialistas formado por John Everard, Eric Marzolf, Duk Ho Moon, Alexander Vilnin, Xiaodong Xue, William J. Newcomb e Katsuhisa Furukawa emitiu o seu relatório final sobre as sanções à RPDC [10]. Embora sua tarefa seja específica e exclusivamente relatar o andamento das sanções e suas supostas violações pela RPDC, bem como propor medidas a serem adotadas pelos países-membros, os especialistas não perderam a oportunidade de acusar o governo norte-coreano de incompetência ao suprir a população com alimentos de forma insuficiente. Contudo, não lembraram que as sanções impostas pelo Conselho de Segurança têm responsabilidade direta. A página oficial do Programa Mundial de Alimentos sobre a RPDC é muito mais honesta: “questões econômicas e políticas [além das naturais] adicionam mais dificuldades, com restrições ao comércio internacional e investimentos impostas pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas.” [11] O relatório do Painel de Especialistas admite que sabe dos riscos de as sanções atingirem a população, mas não consultou o governo coreano para obter informações sobre como elas poderiam estar prejudicando os cidadãos comuns.

De fato, entre as fontes de informações dos especialistas estão o governo dos Estados Unidos, entidades ligadas a este, a imprensa ocidental e também muitas fontes não nomeadas. O Painel fez mais de uma reunião com o governo da Coreia do Sul em Seul, bem como com o governo japonês em Tóquio. Além disso, participou de cerca de 20 reuniões ou eventos nos Estados Unidos e na Coreia do Sul, com a presença de think tanks, fundações, institutos, universidades e acadêmicos naturalmente impregnados de preconceitos sobre a RPDC. É indiscutível que as fontes, os ambientes, os governos a quem os especialistas servem e sua própria visão de mundo influenciaram o relatório, a ponto de tecer insinuações enviesadas e sem a apresentação de nenhuma evidência sobre exportações ilícitas de material bélico para países como Síria e Myanmar (p. 26). Logicamente, a principal conclusão do Painel é que o regime de sanções contra a RPDC precisava ser observado com mais rigor e ampliado.

Referências

[1] “Letter dated 14 October 2010 from the Secretary-General addressed to the President of the Security Council”. United Nations Security Council (S/2010/527), 14 de outubro de 2010. Disponível em: https://www.securitycouncilreport.org/atf/cf/%7B65BFCF9B-6D27-4E9C-8CD3-CF6E4FF96FF9%7D/DPRK%20S%202010%20527.pdf. Acesso em 21 de outubro de 2024.

[2] “George A. Lopez Appointed to Lead USIP’s Academy”. United States Institute of Peace. Press release, 3 de setembro de 2013. Disponível em: https://www.usip.org/press/2013/09/george-lopez-appointed-lead-usips-academy. Acesso em 21 de outubro de 2024.

[3] Lopez, George A. “Bankrupt the Regime”. U.S. News & World Report, 20 de abril de 2017. Disponível em: https://www.usnews.com/opinion/debate-club/articles/2017-04-20/the-trump-administration-should-aim-to-bankrupt-north-korea. Acesso em 21 de outubro de 2024.

[4] “Letter dated 27 June 2011 from the Secretary-General addressed to the President of the Security Council”. United Nations Security Council (S/2011/391), 27 de junho de 2011. Disponível em: https://www.securitycouncilreport.org/atf/cf/%7B65BFCF9B-6D27-4E9C-8CD3-CF6E4FF96FF9%7D/NKorea%20S%202011%20391.pdf. Acesso em 21 de outubro de 2024.

[5] John Everard. Visitors and Affiliates. Walter H. Shorenstein Asia-Pacific Research Center, Stanford University. Disponível em: https://aparc.fsi.stanford.edu/people/john_everard. Acesso em 25 de outubro de 2024.

[6] Everard, John. “The Panel of Experts on North Korea is dead. Long live the Panel of Experts.”. NK News, 1 de maio de 2024. Disponível em: https://www.nknews.org/2024/05/the-un-panel-of-experts-on-north-korea-is-dead-long-live-the-panel-of-experts/. Acesso em 25 de outubro de 2024.

[7] “King County Council member welcomes new consul general of Korea to Federal Way”. Federal Way Mirror, 23 de abril de 2014. Disponível em: https://www.federalwaymirror.com/news/king-county-council-member-welcomes-new-consul-general-of-korea-to-federal-way/. Acesso em 25 de outubro de 2024.

[8] William Newcomb. Member Directory, The National Committee on North Korea. Disponível em: https://www.ncnk.org/member-directory/william-newcomb. Acesso em 30 de outubro de 2024.

[9] Furukawa Katsuhisa. Participant Biographies, The Asan Institute for Policy Studies. Disponível em: https://en.asaninst.org/events_category/asan-plenum/sub_category/participant-biographies/page/3/?u=46840. Acesso em 30 de outubro de 2024.

[10] “Report of the Panel of Experts established pursuant to resolution 1874 (2009)”. United Nations Security Council (S/2012/422), 14 de junho de 2012. Disponível em: https://www.securitycouncilreport.org/atf/cf/%7B65BFCF9B-6D27-4E9C-8CD3-CF6E4FF96FF9%7D/NKorea%20S%202012%20422.pdf. Acesso em 30 de outubro de 2024.

[11] Democratic People’s Republic of Korea. World Food Programme. Disponível em: https://www.wfp.org/countries/democratic-peoples-republic-korea. Acesso em 30 de outubro de 2024.

Quando um «especialista» admitiu a natureza política (e não técnica) do Painel da ONU sobre a Coreia

O Painel fez mais de uma reunião com o governo da Coreia do Sul em Seul, bem como com o governo japonês em Tóquio.

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Neste segundo artigo da série sobre os painéis de especialistas do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre a República Popular Democrática da Coreia, analisaremos a atuação da equipe que elaborou o segundo relatório sobre as supostas violações das sanções ao programa nuclear por parte de Pyongyang. Assim como o primeiro Painel, veremos que este também foi formado por funcionários dos governos de países hostis à RPDC, ou ao menos pessoas de confiança do imperialismo americano para atuar contra a Coreia.

Em 7 de junho de 2010, o Conselho de Segurança estendeu o mandato do Painel de Especialistas até 12 de junho de 2011. Em outubro de 2010, Ban Ki-moon informou à presidência do Conselho de Segurança que Asada e Comras haviam decidido deixar a equipe de especialistas e apontou o japonês Takehiro Yamamoto para o lugar de Asada nas questões nucleares e o norte-americano George Lopez para o lugar de Comras nos assuntos financeiros [1]. Em dezembro, o britânico David J. Birch também decidiu deixar o Painel. Vejamos, por exemplo, quem é George Lopez. Trata-se de um “intelectual orgânico” do Estado norte-americano, tendo assumido posições de liderança em instituições estatais, como o United States Institute of Peace (USIP), e aconselhado o Departamento de Estado [2]. Com efeito, os artigos publicados por Lopez na imprensa sobre a RPDC geralmente buscam orientar a política dos Estados no sentido de aprofundar o regime de sanções contra o país asiático. Ele já pediu publicamente para que o governo americano “leve o regime à falência”, rotulando a RPDC de “império criminoso”, “cleptocracia criminosa” e “governo clientelista corrupto”. “Até que nós estrangulemos esse sistema, não seremos capazes de bloquear seu programa nuclear ou de mísseis”, segundo ele [3].

Após o término do primeiro mandato estendido do Painel de Especialistas, em 12 de junho de 2011, Ban Ki-moon apontou os integrantes do segundo Painel: John Everard para as questões regionais (representando o Reino Unido), George A. Lopez para as questões financeiras (representando os EUA), Eric Marzolf para a questão da tecnologia de mísseis (representando a França), Duk Ho Moon para o tema da proliferação de armas de destruição em massa (representando a Coreia do Sul), Alexander Vilnin para os temas de alfândega (representando a Rússia), Xiaodong Xue para o controle de exportações e materiais nucleares (representando a China) e Takehiko Yamamoto para as questões nucleares (representando o Japão) [4].

John Everard, coordenador do Painel, era um experiente diplomata, tendo inclusive servido como embaixador do Reino Unido em Pyongyang por cerca de três anos [5]. Evidentemente defensor das sanções contra a RPDC, lamentou posteriormente o fim do Painel de Especialistas, mas acabou admitindo que a membresia no painel “era determinada mais pela nacionalidade do que pelas habilidades” dos pretensos especialistas [6] – ou seja, sua natureza era muito mais política do que técnica. Duk Ho Moon, por sua vez, é membro do serviço diplomático da Coreia do Sul desde 1987, tendo trabalhado na Ásia, Europa e EUA [7].

Posteriormente, George A. Lopez e Takehiko Yamamoto foram substituídos por William J. Newcomb (em setembro de 2011) e Katsuhisa Furukawa (em outubro de 2011), respectivamente. Funcionário de carreira do governo dos EUA, Newcomb já havia trabalhado no Departamento de Estado e no Departamento do Tesouro [8]. O novo representante do Japão, por sua vez, é ligado tanto ao governo japonês como ao estadunidense, tendo estudado em Harvard e trabalhado inclusive no Conselho de Relações Exteriores dos EUA [9].

Em 14 de junho de 2012, o Painel de Especialistas formado por John Everard, Eric Marzolf, Duk Ho Moon, Alexander Vilnin, Xiaodong Xue, William J. Newcomb e Katsuhisa Furukawa emitiu o seu relatório final sobre as sanções à RPDC [10]. Embora sua tarefa seja específica e exclusivamente relatar o andamento das sanções e suas supostas violações pela RPDC, bem como propor medidas a serem adotadas pelos países-membros, os especialistas não perderam a oportunidade de acusar o governo norte-coreano de incompetência ao suprir a população com alimentos de forma insuficiente. Contudo, não lembraram que as sanções impostas pelo Conselho de Segurança têm responsabilidade direta. A página oficial do Programa Mundial de Alimentos sobre a RPDC é muito mais honesta: “questões econômicas e políticas [além das naturais] adicionam mais dificuldades, com restrições ao comércio internacional e investimentos impostas pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas.” [11] O relatório do Painel de Especialistas admite que sabe dos riscos de as sanções atingirem a população, mas não consultou o governo coreano para obter informações sobre como elas poderiam estar prejudicando os cidadãos comuns.

De fato, entre as fontes de informações dos especialistas estão o governo dos Estados Unidos, entidades ligadas a este, a imprensa ocidental e também muitas fontes não nomeadas. O Painel fez mais de uma reunião com o governo da Coreia do Sul em Seul, bem como com o governo japonês em Tóquio. Além disso, participou de cerca de 20 reuniões ou eventos nos Estados Unidos e na Coreia do Sul, com a presença de think tanks, fundações, institutos, universidades e acadêmicos naturalmente impregnados de preconceitos sobre a RPDC. É indiscutível que as fontes, os ambientes, os governos a quem os especialistas servem e sua própria visão de mundo influenciaram o relatório, a ponto de tecer insinuações enviesadas e sem a apresentação de nenhuma evidência sobre exportações ilícitas de material bélico para países como Síria e Myanmar (p. 26). Logicamente, a principal conclusão do Painel é que o regime de sanções contra a RPDC precisava ser observado com mais rigor e ampliado.

Referências

[1] “Letter dated 14 October 2010 from the Secretary-General addressed to the President of the Security Council”. United Nations Security Council (S/2010/527), 14 de outubro de 2010. Disponível em: https://www.securitycouncilreport.org/atf/cf/%7B65BFCF9B-6D27-4E9C-8CD3-CF6E4FF96FF9%7D/DPRK%20S%202010%20527.pdf. Acesso em 21 de outubro de 2024.

[2] “George A. Lopez Appointed to Lead USIP’s Academy”. United States Institute of Peace. Press release, 3 de setembro de 2013. Disponível em: https://www.usip.org/press/2013/09/george-lopez-appointed-lead-usips-academy. Acesso em 21 de outubro de 2024.

[3] Lopez, George A. “Bankrupt the Regime”. U.S. News & World Report, 20 de abril de 2017. Disponível em: https://www.usnews.com/opinion/debate-club/articles/2017-04-20/the-trump-administration-should-aim-to-bankrupt-north-korea. Acesso em 21 de outubro de 2024.

[4] “Letter dated 27 June 2011 from the Secretary-General addressed to the President of the Security Council”. United Nations Security Council (S/2011/391), 27 de junho de 2011. Disponível em: https://www.securitycouncilreport.org/atf/cf/%7B65BFCF9B-6D27-4E9C-8CD3-CF6E4FF96FF9%7D/NKorea%20S%202011%20391.pdf. Acesso em 21 de outubro de 2024.

[5] John Everard. Visitors and Affiliates. Walter H. Shorenstein Asia-Pacific Research Center, Stanford University. Disponível em: https://aparc.fsi.stanford.edu/people/john_everard. Acesso em 25 de outubro de 2024.

[6] Everard, John. “The Panel of Experts on North Korea is dead. Long live the Panel of Experts.”. NK News, 1 de maio de 2024. Disponível em: https://www.nknews.org/2024/05/the-un-panel-of-experts-on-north-korea-is-dead-long-live-the-panel-of-experts/. Acesso em 25 de outubro de 2024.

[7] “King County Council member welcomes new consul general of Korea to Federal Way”. Federal Way Mirror, 23 de abril de 2014. Disponível em: https://www.federalwaymirror.com/news/king-county-council-member-welcomes-new-consul-general-of-korea-to-federal-way/. Acesso em 25 de outubro de 2024.

[8] William Newcomb. Member Directory, The National Committee on North Korea. Disponível em: https://www.ncnk.org/member-directory/william-newcomb. Acesso em 30 de outubro de 2024.

[9] Furukawa Katsuhisa. Participant Biographies, The Asan Institute for Policy Studies. Disponível em: https://en.asaninst.org/events_category/asan-plenum/sub_category/participant-biographies/page/3/?u=46840. Acesso em 30 de outubro de 2024.

[10] “Report of the Panel of Experts established pursuant to resolution 1874 (2009)”. United Nations Security Council (S/2012/422), 14 de junho de 2012. Disponível em: https://www.securitycouncilreport.org/atf/cf/%7B65BFCF9B-6D27-4E9C-8CD3-CF6E4FF96FF9%7D/NKorea%20S%202012%20422.pdf. Acesso em 30 de outubro de 2024.

[11] Democratic People’s Republic of Korea. World Food Programme. Disponível em: https://www.wfp.org/countries/democratic-peoples-republic-korea. Acesso em 30 de outubro de 2024.

O Painel fez mais de uma reunião com o governo da Coreia do Sul em Seul, bem como com o governo japonês em Tóquio.

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Neste segundo artigo da série sobre os painéis de especialistas do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre a República Popular Democrática da Coreia, analisaremos a atuação da equipe que elaborou o segundo relatório sobre as supostas violações das sanções ao programa nuclear por parte de Pyongyang. Assim como o primeiro Painel, veremos que este também foi formado por funcionários dos governos de países hostis à RPDC, ou ao menos pessoas de confiança do imperialismo americano para atuar contra a Coreia.

Em 7 de junho de 2010, o Conselho de Segurança estendeu o mandato do Painel de Especialistas até 12 de junho de 2011. Em outubro de 2010, Ban Ki-moon informou à presidência do Conselho de Segurança que Asada e Comras haviam decidido deixar a equipe de especialistas e apontou o japonês Takehiro Yamamoto para o lugar de Asada nas questões nucleares e o norte-americano George Lopez para o lugar de Comras nos assuntos financeiros [1]. Em dezembro, o britânico David J. Birch também decidiu deixar o Painel. Vejamos, por exemplo, quem é George Lopez. Trata-se de um “intelectual orgânico” do Estado norte-americano, tendo assumido posições de liderança em instituições estatais, como o United States Institute of Peace (USIP), e aconselhado o Departamento de Estado [2]. Com efeito, os artigos publicados por Lopez na imprensa sobre a RPDC geralmente buscam orientar a política dos Estados no sentido de aprofundar o regime de sanções contra o país asiático. Ele já pediu publicamente para que o governo americano “leve o regime à falência”, rotulando a RPDC de “império criminoso”, “cleptocracia criminosa” e “governo clientelista corrupto”. “Até que nós estrangulemos esse sistema, não seremos capazes de bloquear seu programa nuclear ou de mísseis”, segundo ele [3].

Após o término do primeiro mandato estendido do Painel de Especialistas, em 12 de junho de 2011, Ban Ki-moon apontou os integrantes do segundo Painel: John Everard para as questões regionais (representando o Reino Unido), George A. Lopez para as questões financeiras (representando os EUA), Eric Marzolf para a questão da tecnologia de mísseis (representando a França), Duk Ho Moon para o tema da proliferação de armas de destruição em massa (representando a Coreia do Sul), Alexander Vilnin para os temas de alfândega (representando a Rússia), Xiaodong Xue para o controle de exportações e materiais nucleares (representando a China) e Takehiko Yamamoto para as questões nucleares (representando o Japão) [4].

John Everard, coordenador do Painel, era um experiente diplomata, tendo inclusive servido como embaixador do Reino Unido em Pyongyang por cerca de três anos [5]. Evidentemente defensor das sanções contra a RPDC, lamentou posteriormente o fim do Painel de Especialistas, mas acabou admitindo que a membresia no painel “era determinada mais pela nacionalidade do que pelas habilidades” dos pretensos especialistas [6] – ou seja, sua natureza era muito mais política do que técnica. Duk Ho Moon, por sua vez, é membro do serviço diplomático da Coreia do Sul desde 1987, tendo trabalhado na Ásia, Europa e EUA [7].

Posteriormente, George A. Lopez e Takehiko Yamamoto foram substituídos por William J. Newcomb (em setembro de 2011) e Katsuhisa Furukawa (em outubro de 2011), respectivamente. Funcionário de carreira do governo dos EUA, Newcomb já havia trabalhado no Departamento de Estado e no Departamento do Tesouro [8]. O novo representante do Japão, por sua vez, é ligado tanto ao governo japonês como ao estadunidense, tendo estudado em Harvard e trabalhado inclusive no Conselho de Relações Exteriores dos EUA [9].

Em 14 de junho de 2012, o Painel de Especialistas formado por John Everard, Eric Marzolf, Duk Ho Moon, Alexander Vilnin, Xiaodong Xue, William J. Newcomb e Katsuhisa Furukawa emitiu o seu relatório final sobre as sanções à RPDC [10]. Embora sua tarefa seja específica e exclusivamente relatar o andamento das sanções e suas supostas violações pela RPDC, bem como propor medidas a serem adotadas pelos países-membros, os especialistas não perderam a oportunidade de acusar o governo norte-coreano de incompetência ao suprir a população com alimentos de forma insuficiente. Contudo, não lembraram que as sanções impostas pelo Conselho de Segurança têm responsabilidade direta. A página oficial do Programa Mundial de Alimentos sobre a RPDC é muito mais honesta: “questões econômicas e políticas [além das naturais] adicionam mais dificuldades, com restrições ao comércio internacional e investimentos impostas pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas.” [11] O relatório do Painel de Especialistas admite que sabe dos riscos de as sanções atingirem a população, mas não consultou o governo coreano para obter informações sobre como elas poderiam estar prejudicando os cidadãos comuns.

De fato, entre as fontes de informações dos especialistas estão o governo dos Estados Unidos, entidades ligadas a este, a imprensa ocidental e também muitas fontes não nomeadas. O Painel fez mais de uma reunião com o governo da Coreia do Sul em Seul, bem como com o governo japonês em Tóquio. Além disso, participou de cerca de 20 reuniões ou eventos nos Estados Unidos e na Coreia do Sul, com a presença de think tanks, fundações, institutos, universidades e acadêmicos naturalmente impregnados de preconceitos sobre a RPDC. É indiscutível que as fontes, os ambientes, os governos a quem os especialistas servem e sua própria visão de mundo influenciaram o relatório, a ponto de tecer insinuações enviesadas e sem a apresentação de nenhuma evidência sobre exportações ilícitas de material bélico para países como Síria e Myanmar (p. 26). Logicamente, a principal conclusão do Painel é que o regime de sanções contra a RPDC precisava ser observado com mais rigor e ampliado.

Referências

[1] “Letter dated 14 October 2010 from the Secretary-General addressed to the President of the Security Council”. United Nations Security Council (S/2010/527), 14 de outubro de 2010. Disponível em: https://www.securitycouncilreport.org/atf/cf/%7B65BFCF9B-6D27-4E9C-8CD3-CF6E4FF96FF9%7D/DPRK%20S%202010%20527.pdf. Acesso em 21 de outubro de 2024.

[2] “George A. Lopez Appointed to Lead USIP’s Academy”. United States Institute of Peace. Press release, 3 de setembro de 2013. Disponível em: https://www.usip.org/press/2013/09/george-lopez-appointed-lead-usips-academy. Acesso em 21 de outubro de 2024.

[3] Lopez, George A. “Bankrupt the Regime”. U.S. News & World Report, 20 de abril de 2017. Disponível em: https://www.usnews.com/opinion/debate-club/articles/2017-04-20/the-trump-administration-should-aim-to-bankrupt-north-korea. Acesso em 21 de outubro de 2024.

[4] “Letter dated 27 June 2011 from the Secretary-General addressed to the President of the Security Council”. United Nations Security Council (S/2011/391), 27 de junho de 2011. Disponível em: https://www.securitycouncilreport.org/atf/cf/%7B65BFCF9B-6D27-4E9C-8CD3-CF6E4FF96FF9%7D/NKorea%20S%202011%20391.pdf. Acesso em 21 de outubro de 2024.

[5] John Everard. Visitors and Affiliates. Walter H. Shorenstein Asia-Pacific Research Center, Stanford University. Disponível em: https://aparc.fsi.stanford.edu/people/john_everard. Acesso em 25 de outubro de 2024.

[6] Everard, John. “The Panel of Experts on North Korea is dead. Long live the Panel of Experts.”. NK News, 1 de maio de 2024. Disponível em: https://www.nknews.org/2024/05/the-un-panel-of-experts-on-north-korea-is-dead-long-live-the-panel-of-experts/. Acesso em 25 de outubro de 2024.

[7] “King County Council member welcomes new consul general of Korea to Federal Way”. Federal Way Mirror, 23 de abril de 2014. Disponível em: https://www.federalwaymirror.com/news/king-county-council-member-welcomes-new-consul-general-of-korea-to-federal-way/. Acesso em 25 de outubro de 2024.

[8] William Newcomb. Member Directory, The National Committee on North Korea. Disponível em: https://www.ncnk.org/member-directory/william-newcomb. Acesso em 30 de outubro de 2024.

[9] Furukawa Katsuhisa. Participant Biographies, The Asan Institute for Policy Studies. Disponível em: https://en.asaninst.org/events_category/asan-plenum/sub_category/participant-biographies/page/3/?u=46840. Acesso em 30 de outubro de 2024.

[10] “Report of the Panel of Experts established pursuant to resolution 1874 (2009)”. United Nations Security Council (S/2012/422), 14 de junho de 2012. Disponível em: https://www.securitycouncilreport.org/atf/cf/%7B65BFCF9B-6D27-4E9C-8CD3-CF6E4FF96FF9%7D/NKorea%20S%202012%20422.pdf. Acesso em 30 de outubro de 2024.

[11] Democratic People’s Republic of Korea. World Food Programme. Disponível em: https://www.wfp.org/countries/democratic-peoples-republic-korea. Acesso em 30 de outubro de 2024.

The views of individual contributors do not necessarily represent those of the Strategic Culture Foundation.

See also

August 6, 2025
August 2, 2025

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August 6, 2025
August 2, 2025
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