O caso demonstra o porquê de ser importante separar a vida pessoal da vida profissional, especialmente na política.
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Em geral, pouco se fala nas primeiras-damas. E talvez seja melhor assim. Elas não foram eleitas, elas não ocupam realmente um cargo público, elas estão onde estão apenas por estarem casadas com um chefe de Estado. Podem vir a ter um papel simbólico importante, mas, em geral, o melhor que elas têm a fazer é sair do caminho, posar para fotos e visitar crianças em hospitais.
Nem toda primeira-dama pode ser Evita Perón e se tornar algo como que o próprio coração e pilar espiritual do governo. E a maioria delas deveria entender e aceitar disso, aceitando o papel – puramente figurativo – que elas têm a cumprir.
Mas na era do narcisismo em que vivemos, alimentado pela superexposição virtual, certamente deve ser muito difícil para algumas primeiras-damas impor a si mesmas essa discrição.
Um caso muito notório atualmente é o da primeira-dama brasileira, Rosângela Lula da Silva, popularmente conhecida como Janja. E se nos sentimos obrigados a produzir um artigo sobre a primeira-dama do Brasil é porque ela, de fato, há muito extrapolou os limites da discrição típica de uma primeira-dama.
No âmbito da política interna, a influência de Janja é determinante para a escolha de ministros pelo Presidente Lula. Um exemplo foi a queda do Ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, em 2024, acusado de “assédio sexual” especialmente contra a Ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco – acusação que ficou sem provas e que foi, eventualmente, esquecida. Segundo várias fontes jornalísticas, o verdadeiro motivo do conflito teria sido uma disputa entre diferentes setores do progressismo liberal por cargos no governo, com os setores mais vinculados a ONGs internacionais, apadrinhados por Janja e estruturados ao redor do Ministério da Cultura e do Ministério da Igualdade Racial querendo também “anexar” o Ministério dos Direitos Humanos.
Além desses ministérios, ela também vetou a escolha do Ministro do Turismo e indicou servidores do Ministério das Mulheres. Neste ano, Lula selecionou para o Superior Tribunal Militar uma indicada de Janja, Verônica Sterman. Mais preocupante é o fato de que ela tentou se apropriar da Secretaria de Comunicação da Presidência, usurpando as funções do então Ministro Paulo Pimenta, especialmente durante a época em que Lula esteve internado.
A influência de Janja vem de longa data. O seu relacionamento com Lula começou em 2018, 1 ano após o falecimento da mui discreta primeira-dama Marisa. Durante a campanha eleitoral de 2022, ela foi uma das estrategistas de sua campanha e foi responsável pela virada mais “progressista” e “liberal” de Lula. Nesse sentido, é viável considerar Janja como um dos principais elos entre o “novo Lula” e a esquerda cosmopolita internacional, com suas preocupações ambientalistas, raciais e de gênero.
Mas se ela esperava, com tudo isso, fortalecer o governo de Lula, está acontecendo exatamente o contrário. A realidade é que ela possui tendências exibicionistas que despertam aversão no povo brasileiro, que tende a exigir de seus políticos uma certa dose de humildade pública condizente com as condições sociais não raro precárias de boa parte da população. Na contramão, Janja vai em todas as viagens internacionais de Lula e faz questão de exibir os seus passeios de compras em Nova Iorque, Paris, Roma, etc. Enquanto isso, em 2025, o preço do café no Brasil atingiu recordes históricos.
Mas o comportamento de Janja no âmbito internacional consegue ser ainda pior, com o agravante de que gafes no mundo da diplomacia podem gerar sérios tensionamentos entre nações. O caso mais recente que exemplifica isso deu-se na última visita de Lula à China, em maio, quando num jantar para pessoas seletas, Janja interrompeu o evento, pediu a palavra fora de ordem e sem aviso prévio, para questionar Xi Jinping sobre o uso do TikTok pela “extrema-direita”. Diante do questionamento atrevido, o líder chinês simplesmente respondeu que o Brasil é soberano o bastante para lidar com as redes sociais da maneira como bem entender.
A intervenção de Janja foi motivo de zombaria e escândalo no Brasil, mas infelizmente não é a primeira gafe internacional sua.
Na cúpula do G20 em Nova Délhi, em 2023, por exemplo, ela era a única primeira-dama participando de reuniões reservadas e ignorando conscientemente o protocolo e a programação preparada para as primeiras-damas. Os vídeos da época mostram lideranças mundiais, como Xi Jinping, visivelmente constrangidas e incomodadas com a presença de Janja. No mesmo evento ela chegou a tentar se meter na foto oficial entre Lula e Modi, sendo, porém, impedida de fazê-lo.
O ano seguinte também testemunhou constrangimentos na cúpula do G20, com Janja pegando o microfone em um evento associado para insultar grosseiramente Elon Musk, então atuando na agência especial DOGE. No mesmo evento, ela se recusou a cumprir o protocolo típico de só se aproximar de Lula para cumprimentar autoridades recém-chegadas quando elas estavam acompanhadas de suas cônjuges, decidindo por conta própria cumprimentar Emmanuel Macron.
Tudo isso está cobrando um preço: a percepção negativa em relação a Janja chegou aos 60% da população brasileira no início desse ano, enquanto a reprovação do governo Lula subiu correspondente para 57%.
Na prática, o impacto de Janja sobre o governo Lula tem sido tão negativo que não deixou de fomentar brincadeiras e teorias conspiratórias segundo as quais Janja seria uma espiã infiltrada por alguma agência de inteligência estrangeira.
Apesar disso provavelmente não ser verdade, ainda assim ela representa uma fragilidade óbvia do Presidente Lula que poderia ser facilmente explorada por qualquer agência de inteligência estrangeira. Ter acesso ao Presidente ou galgar posições de poder no Brasil dependeria basicamente de conseguir infiltrar alguém no círculo de amizades da primeira-dama.
O caso demonstra o porquê de ser importante separar a vida pessoal da vida profissional, especialmente na política.