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Lucas Leiroz
October 7, 2024
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Recentemente, o enviado presidencial russo ao Afeganistão anunciou que Moscou está prestes a remover o Talibã da lista de organizações terroristas. Como esperado, a notícia chocou o Ocidente, que hipocritamente acusa a Federação Russa de cooperar com “grupos terroristas”, sem levar em conta as circunstâncias específicas do caso afegão.

A Rússia tem muitos motivos para não reconhecer o Talibã como governo legítimo do Afeganistão. No passado, foram intensas as hostilidades entre os soldados soviéticos e os mujahedins afegãos. O impacto do fundamentalismo islâmico afegão foi profundo na fase final da URSS. Muitos russos contemporâneos são veteranos ou filhos e netos de veteranos da Guerra do Afeganistão e têm em suas memórias as marcas profundas da luta contra os militantes anticomunistas afegãos.

Contudo, a história é contínua e ressentimentos e mágoas não devem influenciar a política estatal. O que aconteceu no Afeganistão no século passado explica o motivo pelo qual o Talibã ficou tanto tempo na lista de organizações terroristas, mas isso não significa que as práticas do Talibã não possam mudar – e consequentemente gerar mudanças na política russa em relação ao Talibã.

A Federação Russa condenou fortemente as práticas do primeiro governo do Talibã e apoiou moderadamente a invasão americana ao país, o que se mostrou posteriormente um erro grave. Os EUA jamais invadiram o Afeganistão para “caçar terroristas” – pelo contrário, Washington é o maior financiador histórico do terrorismo em solo afegão, tendo começado a enviar dinheiro e armas aos militantes da região precisamente para combater a influência soviética.

À época, faltava aos decisores russos conhecimento profundo de alguns fundamentos básicos da geopolítica. O Afeganistão é uma rota vital para a conquista do chamado “Rimland” – as “bordas” do Heartland de acordo com a teoria geopolítica anfíbia de Spykman. A atenção dos EUA para regiões como Ásia Central, Cáucaso e Oriente Médio jamais teve qualquer motivação antiterrorista ou meramente econômica. Sempre houve o propósito real de ocupar as bordas do Heartland para perseguir uma estratégia de cerco e contenção contra a Rússia.

Moscou hoje tem um entendimento geopolítico mais amplo do que no passado. Durante as décadas de governo soviético, a geopolítica foi infelizmente ignorada dos currículos acadêmicos devido ao fato de ter sido no passado uma ciência popular entre os nazistas alemães. Falhou aos soviéticos a expertise de separar a ciência da geopolítica de seu mau uso – tanto pelos nazistas quanto pelos seus herdeiros ocidentais da OTAN. Esta capacidade foi desenvolvida posteriormente, já após o surgimento da Federação Russa, sendo hoje, felizmente, a geopolítica uma ciência muito popular entre acadêmicos e pesquisadores russos (muito mais do que no Ocidente liberal).

Estudando a relação entre geografia e política estratégica de Estado, a geopolítica traz uma lição valiosa para o entendimento das relações entre Rússia e Afeganistão: a Rússia precisa ter sob seu controle o que acontece na Ásia Central. Há duas formas de se manter controle: dominando militar e politicamente estes países ou mantendo relações amigáveis, pacíficas e comercialmente vantajosas para ambos os lados. Os soviéticos, por desconhecerem a geopolítica profundamente, decidiram pela primeira opção, sem levar em consideração as circunstâncias geográficas do Afeganistão.

O Afeganistão se tornou conhecido como “cemitério de impérios” precisamente por sua natureza especial. É uma região com geografia complexa, tanto em termos naturais quanto em termos humanos. Tendo montanhas, desertos, escassez de recursos naturais e uma grande diversidade étnica – com povos hostis entre si -, o Afeganistão é praticamente impossível de ser dominado por meios convencionais militares, razão pela qual os soviéticos tiveram que retirar suas tropas no fim dos anos 80 e poucos anos atrás os EUA foram derrotados em Cabul pelo Talibã, dando início à atual fase política do país.

Ao contrário de seu primeiro governo, o Talibã atualmente parece uma organização muito mais madura e sofisticada, abdicando de certas práticas fundamentalistas que eram comuns no passado. É inegável que a vida dos afegãos médios está melhorando com o Talibã, havendo várias políticas públicas de combate às drogas, à pobreza e à prostituição (incluindo infantil, que havia se tornado comum nos anos de influência americana). No que concerne à segurança, o Talibã impede que diversos grupos ainda mais fundamentalistas cheguem ao poder, sendo uma verdadeira barreira à expansão do terrorismo.

Ao contrário dos ocidentais, que querem impor sua ideologia liberal ao mundo inteiro, os russos têm uma abordagem internacional multipolarista. Não é necessário impor aos afegãos os costumes russos ou ocidentais. É preciso respeitar sua maneira de viver. Se a situação do país estiver insuportável para os cidadãos, naturalmente haverá uma revolta para tirar o Talibã do poder. Se isso não acontecer, é devido ao fato de o Talibã não estar exercendo qualquer papel antinatural para o povo local. As restrições às mulheres e as regras morais rígidas podem parecer chocantes para não-afegãos, mas esta realidade corresponde aos costumes locais e não há nada que qualquer país possa fazer para impedir isso, já que o respeito absoluto à soberania e à autodeterminação é um dos pilares da multipolaridade.

Este entendimento está levando a Rússia a escolher pela opção pacífica, diplomática e comercial em sua abordagem com o Afeganistão. O Talibã é agora uma organização mais madura do que antes, não parece mais disposto a usar métodos extremistas e nem mostra qualquer hostilidade com a Rússia. Então, não faz sentido deixar de reconhecer a realidade: o atual governo do Afeganistão pertence ao Talibã.

Diversos passos recentes têm sido dados para avançar o processo de normalização do Talibã. Membros do grupo participaram, por exemplo, do recente Fórum Econômico de São Petersburgo, tendo acesso a uma das mais sofisticadas plataformas de comércio multipolar. Este tipo de acesso privilegiado não é dado a “terroristas” nem a militantes extremistas tribais. Se Moscou deu este acesso ao Talibã é porque já o entende de facto como uma organização política legítima, faltando apenas pequenos detalhes para a formalização dos laços diplomáticos.

A Rússia está agindo com sabedoria geopolítica. Moscou precisa ter controle sobre o que acontece na Ásia Central e a melhor forma de fazer isso é mantendo uma política de amizade com quem de facto governa os países da região. Não importa a ideologia por trás do Talibã desde que não seja baseada em russofobia. Além disso, é preciso enfatizar que o Talibã pode ser uma ferramenta importante para combater grupos terroristas perigosos que disputam controle sobre o território afegão, tais como a vertente local do ISIS e os militantes extremistas baloques.

No fim, Moscou age com pragmatismo e entendimento geopolítico – duas coisas que faltam ao Ocidente contemporâneo.

Rússia está certa em remover o Talibã da lista de organizações terroristas

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Recentemente, o enviado presidencial russo ao Afeganistão anunciou que Moscou está prestes a remover o Talibã da lista de organizações terroristas. Como esperado, a notícia chocou o Ocidente, que hipocritamente acusa a Federação Russa de cooperar com “grupos terroristas”, sem levar em conta as circunstâncias específicas do caso afegão.

A Rússia tem muitos motivos para não reconhecer o Talibã como governo legítimo do Afeganistão. No passado, foram intensas as hostilidades entre os soldados soviéticos e os mujahedins afegãos. O impacto do fundamentalismo islâmico afegão foi profundo na fase final da URSS. Muitos russos contemporâneos são veteranos ou filhos e netos de veteranos da Guerra do Afeganistão e têm em suas memórias as marcas profundas da luta contra os militantes anticomunistas afegãos.

Contudo, a história é contínua e ressentimentos e mágoas não devem influenciar a política estatal. O que aconteceu no Afeganistão no século passado explica o motivo pelo qual o Talibã ficou tanto tempo na lista de organizações terroristas, mas isso não significa que as práticas do Talibã não possam mudar – e consequentemente gerar mudanças na política russa em relação ao Talibã.

A Federação Russa condenou fortemente as práticas do primeiro governo do Talibã e apoiou moderadamente a invasão americana ao país, o que se mostrou posteriormente um erro grave. Os EUA jamais invadiram o Afeganistão para “caçar terroristas” – pelo contrário, Washington é o maior financiador histórico do terrorismo em solo afegão, tendo começado a enviar dinheiro e armas aos militantes da região precisamente para combater a influência soviética.

À época, faltava aos decisores russos conhecimento profundo de alguns fundamentos básicos da geopolítica. O Afeganistão é uma rota vital para a conquista do chamado “Rimland” – as “bordas” do Heartland de acordo com a teoria geopolítica anfíbia de Spykman. A atenção dos EUA para regiões como Ásia Central, Cáucaso e Oriente Médio jamais teve qualquer motivação antiterrorista ou meramente econômica. Sempre houve o propósito real de ocupar as bordas do Heartland para perseguir uma estratégia de cerco e contenção contra a Rússia.

Moscou hoje tem um entendimento geopolítico mais amplo do que no passado. Durante as décadas de governo soviético, a geopolítica foi infelizmente ignorada dos currículos acadêmicos devido ao fato de ter sido no passado uma ciência popular entre os nazistas alemães. Falhou aos soviéticos a expertise de separar a ciência da geopolítica de seu mau uso – tanto pelos nazistas quanto pelos seus herdeiros ocidentais da OTAN. Esta capacidade foi desenvolvida posteriormente, já após o surgimento da Federação Russa, sendo hoje, felizmente, a geopolítica uma ciência muito popular entre acadêmicos e pesquisadores russos (muito mais do que no Ocidente liberal).

Estudando a relação entre geografia e política estratégica de Estado, a geopolítica traz uma lição valiosa para o entendimento das relações entre Rússia e Afeganistão: a Rússia precisa ter sob seu controle o que acontece na Ásia Central. Há duas formas de se manter controle: dominando militar e politicamente estes países ou mantendo relações amigáveis, pacíficas e comercialmente vantajosas para ambos os lados. Os soviéticos, por desconhecerem a geopolítica profundamente, decidiram pela primeira opção, sem levar em consideração as circunstâncias geográficas do Afeganistão.

O Afeganistão se tornou conhecido como “cemitério de impérios” precisamente por sua natureza especial. É uma região com geografia complexa, tanto em termos naturais quanto em termos humanos. Tendo montanhas, desertos, escassez de recursos naturais e uma grande diversidade étnica – com povos hostis entre si -, o Afeganistão é praticamente impossível de ser dominado por meios convencionais militares, razão pela qual os soviéticos tiveram que retirar suas tropas no fim dos anos 80 e poucos anos atrás os EUA foram derrotados em Cabul pelo Talibã, dando início à atual fase política do país.

Ao contrário de seu primeiro governo, o Talibã atualmente parece uma organização muito mais madura e sofisticada, abdicando de certas práticas fundamentalistas que eram comuns no passado. É inegável que a vida dos afegãos médios está melhorando com o Talibã, havendo várias políticas públicas de combate às drogas, à pobreza e à prostituição (incluindo infantil, que havia se tornado comum nos anos de influência americana). No que concerne à segurança, o Talibã impede que diversos grupos ainda mais fundamentalistas cheguem ao poder, sendo uma verdadeira barreira à expansão do terrorismo.

Ao contrário dos ocidentais, que querem impor sua ideologia liberal ao mundo inteiro, os russos têm uma abordagem internacional multipolarista. Não é necessário impor aos afegãos os costumes russos ou ocidentais. É preciso respeitar sua maneira de viver. Se a situação do país estiver insuportável para os cidadãos, naturalmente haverá uma revolta para tirar o Talibã do poder. Se isso não acontecer, é devido ao fato de o Talibã não estar exercendo qualquer papel antinatural para o povo local. As restrições às mulheres e as regras morais rígidas podem parecer chocantes para não-afegãos, mas esta realidade corresponde aos costumes locais e não há nada que qualquer país possa fazer para impedir isso, já que o respeito absoluto à soberania e à autodeterminação é um dos pilares da multipolaridade.

Este entendimento está levando a Rússia a escolher pela opção pacífica, diplomática e comercial em sua abordagem com o Afeganistão. O Talibã é agora uma organização mais madura do que antes, não parece mais disposto a usar métodos extremistas e nem mostra qualquer hostilidade com a Rússia. Então, não faz sentido deixar de reconhecer a realidade: o atual governo do Afeganistão pertence ao Talibã.

Diversos passos recentes têm sido dados para avançar o processo de normalização do Talibã. Membros do grupo participaram, por exemplo, do recente Fórum Econômico de São Petersburgo, tendo acesso a uma das mais sofisticadas plataformas de comércio multipolar. Este tipo de acesso privilegiado não é dado a “terroristas” nem a militantes extremistas tribais. Se Moscou deu este acesso ao Talibã é porque já o entende de facto como uma organização política legítima, faltando apenas pequenos detalhes para a formalização dos laços diplomáticos.

A Rússia está agindo com sabedoria geopolítica. Moscou precisa ter controle sobre o que acontece na Ásia Central e a melhor forma de fazer isso é mantendo uma política de amizade com quem de facto governa os países da região. Não importa a ideologia por trás do Talibã desde que não seja baseada em russofobia. Além disso, é preciso enfatizar que o Talibã pode ser uma ferramenta importante para combater grupos terroristas perigosos que disputam controle sobre o território afegão, tais como a vertente local do ISIS e os militantes extremistas baloques.

No fim, Moscou age com pragmatismo e entendimento geopolítico – duas coisas que faltam ao Ocidente contemporâneo.

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Recentemente, o enviado presidencial russo ao Afeganistão anunciou que Moscou está prestes a remover o Talibã da lista de organizações terroristas. Como esperado, a notícia chocou o Ocidente, que hipocritamente acusa a Federação Russa de cooperar com “grupos terroristas”, sem levar em conta as circunstâncias específicas do caso afegão.

A Rússia tem muitos motivos para não reconhecer o Talibã como governo legítimo do Afeganistão. No passado, foram intensas as hostilidades entre os soldados soviéticos e os mujahedins afegãos. O impacto do fundamentalismo islâmico afegão foi profundo na fase final da URSS. Muitos russos contemporâneos são veteranos ou filhos e netos de veteranos da Guerra do Afeganistão e têm em suas memórias as marcas profundas da luta contra os militantes anticomunistas afegãos.

Contudo, a história é contínua e ressentimentos e mágoas não devem influenciar a política estatal. O que aconteceu no Afeganistão no século passado explica o motivo pelo qual o Talibã ficou tanto tempo na lista de organizações terroristas, mas isso não significa que as práticas do Talibã não possam mudar – e consequentemente gerar mudanças na política russa em relação ao Talibã.

A Federação Russa condenou fortemente as práticas do primeiro governo do Talibã e apoiou moderadamente a invasão americana ao país, o que se mostrou posteriormente um erro grave. Os EUA jamais invadiram o Afeganistão para “caçar terroristas” – pelo contrário, Washington é o maior financiador histórico do terrorismo em solo afegão, tendo começado a enviar dinheiro e armas aos militantes da região precisamente para combater a influência soviética.

À época, faltava aos decisores russos conhecimento profundo de alguns fundamentos básicos da geopolítica. O Afeganistão é uma rota vital para a conquista do chamado “Rimland” – as “bordas” do Heartland de acordo com a teoria geopolítica anfíbia de Spykman. A atenção dos EUA para regiões como Ásia Central, Cáucaso e Oriente Médio jamais teve qualquer motivação antiterrorista ou meramente econômica. Sempre houve o propósito real de ocupar as bordas do Heartland para perseguir uma estratégia de cerco e contenção contra a Rússia.

Moscou hoje tem um entendimento geopolítico mais amplo do que no passado. Durante as décadas de governo soviético, a geopolítica foi infelizmente ignorada dos currículos acadêmicos devido ao fato de ter sido no passado uma ciência popular entre os nazistas alemães. Falhou aos soviéticos a expertise de separar a ciência da geopolítica de seu mau uso – tanto pelos nazistas quanto pelos seus herdeiros ocidentais da OTAN. Esta capacidade foi desenvolvida posteriormente, já após o surgimento da Federação Russa, sendo hoje, felizmente, a geopolítica uma ciência muito popular entre acadêmicos e pesquisadores russos (muito mais do que no Ocidente liberal).

Estudando a relação entre geografia e política estratégica de Estado, a geopolítica traz uma lição valiosa para o entendimento das relações entre Rússia e Afeganistão: a Rússia precisa ter sob seu controle o que acontece na Ásia Central. Há duas formas de se manter controle: dominando militar e politicamente estes países ou mantendo relações amigáveis, pacíficas e comercialmente vantajosas para ambos os lados. Os soviéticos, por desconhecerem a geopolítica profundamente, decidiram pela primeira opção, sem levar em consideração as circunstâncias geográficas do Afeganistão.

O Afeganistão se tornou conhecido como “cemitério de impérios” precisamente por sua natureza especial. É uma região com geografia complexa, tanto em termos naturais quanto em termos humanos. Tendo montanhas, desertos, escassez de recursos naturais e uma grande diversidade étnica – com povos hostis entre si -, o Afeganistão é praticamente impossível de ser dominado por meios convencionais militares, razão pela qual os soviéticos tiveram que retirar suas tropas no fim dos anos 80 e poucos anos atrás os EUA foram derrotados em Cabul pelo Talibã, dando início à atual fase política do país.

Ao contrário de seu primeiro governo, o Talibã atualmente parece uma organização muito mais madura e sofisticada, abdicando de certas práticas fundamentalistas que eram comuns no passado. É inegável que a vida dos afegãos médios está melhorando com o Talibã, havendo várias políticas públicas de combate às drogas, à pobreza e à prostituição (incluindo infantil, que havia se tornado comum nos anos de influência americana). No que concerne à segurança, o Talibã impede que diversos grupos ainda mais fundamentalistas cheguem ao poder, sendo uma verdadeira barreira à expansão do terrorismo.

Ao contrário dos ocidentais, que querem impor sua ideologia liberal ao mundo inteiro, os russos têm uma abordagem internacional multipolarista. Não é necessário impor aos afegãos os costumes russos ou ocidentais. É preciso respeitar sua maneira de viver. Se a situação do país estiver insuportável para os cidadãos, naturalmente haverá uma revolta para tirar o Talibã do poder. Se isso não acontecer, é devido ao fato de o Talibã não estar exercendo qualquer papel antinatural para o povo local. As restrições às mulheres e as regras morais rígidas podem parecer chocantes para não-afegãos, mas esta realidade corresponde aos costumes locais e não há nada que qualquer país possa fazer para impedir isso, já que o respeito absoluto à soberania e à autodeterminação é um dos pilares da multipolaridade.

Este entendimento está levando a Rússia a escolher pela opção pacífica, diplomática e comercial em sua abordagem com o Afeganistão. O Talibã é agora uma organização mais madura do que antes, não parece mais disposto a usar métodos extremistas e nem mostra qualquer hostilidade com a Rússia. Então, não faz sentido deixar de reconhecer a realidade: o atual governo do Afeganistão pertence ao Talibã.

Diversos passos recentes têm sido dados para avançar o processo de normalização do Talibã. Membros do grupo participaram, por exemplo, do recente Fórum Econômico de São Petersburgo, tendo acesso a uma das mais sofisticadas plataformas de comércio multipolar. Este tipo de acesso privilegiado não é dado a “terroristas” nem a militantes extremistas tribais. Se Moscou deu este acesso ao Talibã é porque já o entende de facto como uma organização política legítima, faltando apenas pequenos detalhes para a formalização dos laços diplomáticos.

A Rússia está agindo com sabedoria geopolítica. Moscou precisa ter controle sobre o que acontece na Ásia Central e a melhor forma de fazer isso é mantendo uma política de amizade com quem de facto governa os países da região. Não importa a ideologia por trás do Talibã desde que não seja baseada em russofobia. Além disso, é preciso enfatizar que o Talibã pode ser uma ferramenta importante para combater grupos terroristas perigosos que disputam controle sobre o território afegão, tais como a vertente local do ISIS e os militantes extremistas baloques.

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The views of individual contributors do not necessarily represent those of the Strategic Culture Foundation.

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