Mal ou bem, os Hutis são a única força política, militar, a fazer algo de muito prático no sentido de exigir que Israel pague pelos seus actos.
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Mal ou bem, os Hutis são a única força política, militar, a fazer algo de muito prático no sentido de exigir que Israel pague pelos seus actos. E, apesar do ataque sofrido nos eu território, já o podemos dizer, com toda a certeza, que o movimento de Ansar Allah e a resistência pró-palestina, em geral, sai reforçada deste acontecimento.
Não fosse um movimento rebelde, composto por gente pobre e vivendo em grandes dificuldades, mais nenhum país da região faria o que quer que fosse, para conferir alguma justiça moral, mesmo que pouca, a todo este processo. Como se diz, quem muito tem, mais tem a perder. Só o pobre dá o que lhe faz falta e este é bem um exemplo disso.
É até curioso que, aqui e ali, com excepção de algumas medidas diplomáticas e comerciais, tenha vindo de fora do continente e do médio oriente, a acção diplomática mais gravosa para Israel: a acusação da África do Sul no Tribunal Internacional de Justiça, para que o estado de Israel seja julgado por genocídio. Como não poderia deixar de ser, logo a acusação foi classificada do muito vulgar epíteto de “anti-semita”.
Mas o papel dos Hutis no Mar Vermelho tem produzido resultados absolutamente imprevisíveis e – talvez inesperados – para o Ocidente. A rota comercial do Mar Vermelho representa 12% do comércio marítimo global e 12% de todo o comércio de petróleo. Uma parte importante dos navios comerciais que fazem o percurso entre o indico e a europa, circulam através do Mar Vermelho.
Acresce que, a importância desta rota, para Israel, é deveras decisiva. O Porto de Eilat vive essencialmente desta rota marítima. Desligar o porto de Eilat, das rotas internacionais da ásia, não significa, apenas, um encarecimento e risco de perecimento de muitas das mercadorias que Israel recebe da Ásia, com todo o fardo económico que daí advém. Mas Implica também um corte no turismo, uma vez que a cidade de Eilat é um importante destino turístico do Médio Oriente e a perda de competitividade das suas exportações para o continente asiático.
Mas, no final de contas, os danos financeiros até poderiam ser ultrapassáveis. O que dificilmente seria superável seria a fragilidade em que um bloqueio efectivo da passagem do Mar Vermelho deixaria Israel.
Imaginemos um cenário, provável, em que as frentes de guerra se multiplicam e alastram o conflito a outras regiões (Líbano, Síria e Iémen). Tal como Omã fechou o seu espaço aéreo à passagem de aviões militares para bombardear o Iémen, também um país como o Egipto poderia, numa situação de grande aperto e pressão popular, equacionar ter de encerrar o Canal do Suez para barcos que estivessem conotados com Israel. Não seria inédito, como se sabe. O próprio Omã, terá impedido a passagem dos aviões militares dos EUA, por várias razões. Uma delas terá a ver com alguma neutralidade que o sultanato vai assumindo na cena internacional. Contudo, essa “neutralidade” também se deve às tensões étnicas que possui nos eu território, que faz fronteira com o Iémen. Seja como for, deixar o porto de Eilat entregue apenas aos barcos que viessem do Canal do Suez teria essa fragilidade estratégica.
Assim, embora não se possa negar que, o bloqueio naval Huti possa constituir um fardo para as restantes nações árabes que recebem os seus navios, em Portos no Mar Vermelho, o facto é que, para nenhuma delas a situação é tão dramática como para Israel. Face ao facto de as mercadorias da ásia, que Israel recebe por via marítima, poderem vir do Mar Vermelho e sem terem de passar pelo canal do Suez, o porto de Eilat torna-se absolutamente estratégico para a estabilidade económica do próprio país. E sem estabilidade económica, nãos e ganham guerras. Mesmo contra quem se arma com, pouco mais, do que pedras e paus e uns rockets artesanais.
Neste sentido, e face ao perigo, não foi preciso muito para que os EUA tratassem de defender o seu ponta de lança no Médio-Oriente, tentando organizar uma coligação internacional a que chamaram de “Operação Guardiães da Prosperidade”.
A tentativa de mascarar esta iniciativa como algo destinado a defender o mundo e a economia global, não terá tido os efeitos propagandísticos pretendidos. O facto é que, como foi amplamente noticiado, foram muitas as nações que não se quiseram associar – umas directamente, outras, directa e indirectamente. Se, por um lado, estava em causa um chamado dos EUA, por outro, à data, ainda ressoavam nas mentes o primado estabelecido pelos Hutis, para o bloqueio: apenas são atingidos navios Israelitas ou de alguma forma conotados com os interesses desse país.
Para a recusa de uns quantos terá concorrido o medo de aparecerem associados à defesa dos interesses do estado de Israel, cuja imagem no cenário internacional estava cada vez mais ligada ao bombardeamento de civis, terraplenamento de cidades, deportações e deslocação de famílias inteiras de suas casas e execução sumária de seres humanos.
Com muito esforço lá conseguiram, os EUA, juntar a sua equipa. Não se poderia esperar outra coisa que não fosse o que sucedeu no passado dia 12 de Janeiro, ou seja, o ataque ao Iémen e em especial às forças Huti.
O evento foi amplamente noticiado na comunicação social corporativa como se de uma verdadeira vitória se tratasse. Um ataque, por potências mundiais, uma delas uma das maiores potências militares do planeta, perpetrado contra um povo depauperado, marcado pela fome e pela guerra, é cantado como uma vitória histórica.
Mas, a verdade é que os Hutis já tinham ganho. Todos nos recordamos das mensagens de Blinken ou Biden aquando das suas frequentes visitas ao estado sionista: não podemos deixar o conflito alastrar ao médio oriente, disseram. Pois, embora este ataque evite o pior, que consiste em garantir que Israel não se envolva em diversas frentes, para poder cumprir, impune e calmamente, o seu plano em direcção a Gaza; o facto é que, neste momento, acabou de se inaugurar uma nova frente de conflito, que se vem adicionar a outros fogos que os EUA já têm em mãos, não se sabendo ainda bem como irá acabar.
A imprevisibilidade deste conflito não se fica por aqui. É que, por muita propaganda que o Tio Sam consiga comprar, já todos se aperceberam que os EUA, e seus vassalos, não olharão a meios para defender Israel, mesmo quando este país se encontra numa situação absolutamente marginal face à lei internacional e ao cumprimento dos mais básicos direitos humanos.
Com tudo isto, os Hutis não apenas conseguiram fazer Israel pagar um preço – muito baixo ainda – pela sua campanha contra Gaza e pelo apartheid que mantém sobre o povo Palestino, como conseguiram mostrar ao mundo, que para os EUA, quando se trata de democracia, direitos humanos, crimes contra a humanidade e crimes de guerra, a sua balança pende sempre para onde pendem os seus interesses hegemónicos. O que exigem e punem a uns, desculpam e premeiam a outros.
Resta-nos agora esperar que o tribunal de The Hague faça o seu trabalho, evitando a sua instrumentalização por interesses hegemónicos, como sucedeu no Tribunal Penal Internacional com Putin, Milosevic e muitos outros africanos e asiáticos, para os quais aquele tribunal mais não é do que um tentáculo do império. É esperar que se faça alguma justiça.
Para já, os Hutis já nos deram alguma, exigindo um preço mais elevado a Israel pelas suas acções, desmascarando a natureza do apoio americano ao sionismo e mostrando ao mundo, uma vez mais, que as nações ocidentais se arrogam no direito de atacar onde e quando querem, sem qualquer respaldo na legislação internacional, sem mantado da ONU, sem sequer terem sido provocados. Uma vez que quem o foi, foi Israel.
Pelo menos, vemos-lhes bem a cara!