Este é mais um artigo da série sobre a história do Painel de Especialistas do Comitê de Sanções do Conselho de Segurança das Nações Unidas para a República Popular Democrática da Coreia.
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Este é mais um artigo da série sobre a história do Painel de Especialistas do Comitê de Sanções do Conselho de Segurança das Nações Unidas para a República Popular Democrática da Coreia. (Os anteriores podem ser acessados aqui, aqui, aqui e aqui.) A nova equipe que publicou o relatório de 24 de fevereiro de 2016 contou com Jiahu Zong no lugar de Chang Guo, da China. O relatório não trouxe nada de significativamente novo, mas chama atenção o reconhecimento explícito, pela primeira vez, dos danos negativos causados pelas sanções contra a população da RPDC.
O Painel também tomou nota do relatório do Secretário-Geral sobre a situação dos direitos humanos na República Popular Democrática da Coreia, no qual se declara que “as sanções unilaterais e das Nações Unidas impostas na República Popular Democrática da Coreia claramente não se aplicam à assistência humanitária, mas elas têm tido impactos negativos intencionais e indiretos na população vulnerável” (A/70/393, para. 41). O Painel continua sua investigação [a respeito]. [1]
Dentre as recomendações do Painel, estava a de que o Conselho de Segurança demandasse aos países-membros da ONU que não tivessem nenhuma cooperação educativa que possibilitasse o ensino ou capacitação dada a cidadãos norte-coreanos “de disciplinas que possam contribuir para os programas proibidos do país”, a não ser apenas o ensino de conhecimento geral ou básico. Na prática, isso fatalmente excluiria a acolhida em universidades estrangeiras de estudantes coreanos de química, física, biologia, engenharia e outras disciplinas nas áreas de ciências exatas e naturais.
O Conselho de Segurança das Nações Unidas adotou essas recomendações do Painel ao emitir a Resolução 2270, em 2 de março de 2016. Também proibiu a exportação de carvão, ferro, ouro, minerais de terras raras e outras riquezas naturais que a RPDC costumava comercializar. Ainda proibiu que quaisquer instituições financeiras da RPDC operassem fora do país e vice-versa, incluindo joint-ventures [2]. Em 30 de novembro do mesmo ano, o Conselho adotou uma nova resolução (a 2321) [3], que também restringiu de modo quase total o comércio marítimo, pediu aos países que reduzissem suas missões diplomáticas na RPDC, proibiu a exportação de cobre, níquel, prata e zinco, mas que reduziu a penalização sobre a exportação de carvão e ouro, permitindo um pequeno comércio. Apesar de tudo isso, a resolução do Conselho de Segurança
Reitera sua profunda preocupação pelas grandes dificuldades que o povo da RPDC está sujeito, condena a RPDC por buscar [obter] armas nucleares e mísseis balísticos ao invés do bem-estar do seu povo enquanto a população da RPDC tem grandes carências não atendidas, e enfatiza a necessidade de a RPDC respeitar e assegurar o bem-estar e a dignidade inerente do povo da RPDC.
As duas resoluções foram uma resposta aos dois testes nucleares realizados pelo país em 2016.
Após quase cinco anos de serviço no Painel de Especialistas, Katsuhisa Furukawa deu lugar a Maiko Takeuchi, nova representante do Japão. Funcionária do governo japonês desde 2001, Takeuchi trabalhou nos ministérios da Defesa e da Economia, Comércio e Indústria, bem como na Secretaria do Gabinete para a Segurança Nacional e a Gestão de Crises. Cursou mestrado em Relações Internacionais no programa para jovens quadros governamentais da Universidade de Harvard. Quando foi apontada para o Painel, estava trabalhando na embaixada japonesa em Seul havia quatro anos [4]. Em 2022, Takeuchi apareceu (junto com William J. Newcomb) em uma peça audiovisual produzida pela RAND Corporation por encomenda do Departamento de Estado dos EUA sobre como a RPDC dribla as sanções impostas contra ela [5]. A RAND Corporation é um dos principais think tanks do complexo industrial-militar dos EUA, foi criada pelo Estado Profundo norte-americano e é financiada pelo governo, força aérea e exército dos EUA para produzir análises que contribuam com a formulação da política externa do país [6].
Após deixar o Painel, Takeuchi serviu como fonte de diversas reportagens que acusam a RPDC de treinar e manter hackers para roubar dinheiro de pessoas e empresas do mundo todo e utilizá-lo para financiar o seu programa nuclear e de mísseis [7], o que o país sempre negou. Contudo, após a dissolução pela não renovação do Painel de Especialistas, devido ao veto da Rússia, em 2024, a funcionária japonesa, ao comemorar a criação de uma equipe de monitoramento pelos Estados Unidos e seus aliados mais próximos, acabou por admitir qual era o objetivo verdadeiro de Washington. Os EUA sempre quiseram, desde o início, utilizar o Painel de Especialistas não como fonte de informações para saber se a RPDC violava as sanções, mas sim como justificativa para impor as sanções, que já estavam preparadas. Isso porque começou como um espaço formado por especialistas e seus respectivos países comprometidos com a política dos EUA de isolamento e asfixia da RPDC. Porém, conforme aumentaram as contradições de interesses, Rússia e China decidiram encerrar o mecanismo, que elas já denunciavam como tendencioso.
“Uma vez que essa é uma organização de países que pensam de maneira semelhante, o mecanismo pode conduzir a atividades de monitoramento de modo mais eficiente”, disse Takeuchi ao se referir à Equipe de Monitoramento Multilateral de Sanções, formada por EUA, Coreia do Sul, Japão, Reino Unido, França, Alemanha, Itália, Holanda, Canadá, Austrália e Nova Zelândia em outubro de 2024. “O novo grupo não vai encontrar os problemas enfrentados pelo Painel do Conselho de Segurança das Nações Unidas, tais como confrontos entre especialistas devido a desacordos entre os países membros.” [8]
O novo relatório do Painel de Especialistas foi publicado em 27 de fevereiro de 2017. Assim como alguns relatórios anteriores, este arriscou realizar rápidas avaliações da situação interna da RPDC, chamando o governo de “regime” e destilando outros preconceitos contra o país. “Domesticamente, Kim Jong Un focou em reforçar a sua base de poder no partido, no exército e na sociedade através do fortalecimento da supervisão militar e do controle interno sobre a sociedade.” [9] Logo, a situação humanitária do país “é em grande medida o resultado da prioridade [que está] sendo dada à indústria militar e de defesa, que tem distorcido significativamente a alocação de recursos econômicos”, embora o Painel tenha feito um pequeno mea culpa sobre o impedimento da transferência de recursos para as agências humanitárias instaladas na RPDC, dificultando o seu trabalho [10].
Referências:
[1] “Report of the Panel of Experts established pursuant to resolution 1874 (2009)”. United Nations Security Council (S/2016/157), 24 de fevereiro de 2016, p.67. Disponível em: https://www.securitycouncilreport.org/atf/cf/%7B65BFCF9B-6D27-4E9C-8CD3-CF6E4FF96FF9%7D/s_2016_157.pdf. Acesso em 26 de dezembro de 2024.
[2] United Nations Security Council. S/RES/2270 (2016), 2 de março de 2026. Disponível em: https://documents.un.org/doc/undoc/gen/n16/058/22/pdf/n1605822.pdf. Acesso em 27 de dezembro de 2024.
[3] United Nations Security Council. S/RES/2321 (2016), 30 de novembro de 2026. Disponível em: https://documents.un.org/doc/undoc/gen/n16/407/50/pdf/n1640750.pdf. Acesso em 27 de dezembro de 2024.
[4] Ms. Maiko Takeuchi. RSEA AM ‘07. 2020 RSEA Alumni Panelist. Committee on Regional Studies East Asia. Harvard University. Disponível em: https://rsea.fas.harvard.edu/people/maiko-takeuchi. Acesso em 27 de dezembro de 2024.
[5] “North Korean Sanctions Evasion”. Zulmé Broussard/RAND Corporation, 2022, 68 min. Disponível em: https://www.rand.org/pubs/research_reports/RRA1537-2.html#north-korean-sanctions-evasion. Acesso em 27 de dezembro de 2024. “A informação apresentada aqui deve ser útil para agentes da alfândega, imigração, aplicação da lei e inteligência em todos os países afetados pelas atividades de evasão de sanções da Coreia do Norte e para a ampla variedade de profissionais que formam pontos de contato com o ecossistema global da evasão de sanções da Coreia do Norte.” O filme faz parte do projeto “Prevenindo as atividades de proliferação da Coreia do Norte”, da RAND (In: https://www.rand.org/nsrd/projects/north-korean-sanctions.html)
[6] Thees, Ana. “RAND Corporation e sua influência na política externa estadunidense”. Observatório Político dos Estados Unidos (OPEU), 15 de maio de 2024. Disponível em: https://www.opeu.org.br/2024/05/15/rand-corporation-influencia-politica-externa-estadunidense/. Acesso em 27 de dezembro de 2024.
[7] “Cyberattacks finance North Korea’s missile development”. NHK World, 24 de novembro de 2023. Disponível em: https://www3.nhk.or.jp/nhkworld/en/news/backstories/2867/. Acesso em 27 de dezembro de 2024.
[8] Maresca, Thomas; Coote, Darryl. “U.S., allies establish North Korean sanctions monitoring team after Russian veto”. UPI, 17 de outubro de 2024. Disponível em: https://www.upi.com/Top_News/World-News/2024/10/18/North-Korea-multilateral-sanctions-monitoring-team-MSMT/3231729148672/. Acesso em 27 de dezembro de 2024.
[9] “Report of the Panel of Experts established pursuant to resolution 1874 (2009)”. United Nations Security Council (S/2017/150), 30 de janeiro de 2017, p.9. Disponível em: https://www.securitycouncilreport.org/atf/cf/%7B65BFCF9B-6D27-4E9C-8CD3-CF6E4FF96FF9%7D/s_2017_150.pdf. Acesso em 28 de dezembro de 2024.
[10] Idem, p. 89.