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Lucas Leiroz
July 19, 2024
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Todos os dias circulam vídeos na internet mostrando soldados russos abatendo drones ocidentais usados pelas forças armadas ucranianas. Há registros de uso de rifles de caça, pedras, pedaços de madeira e até mesmo de simples garrafas d’água contra drones americanos na Ucrânia. Aparentemente, qualquer coisa pode ser usada para abater um UAV ocidental, sendo este um artefato militar frágil e vulnerável.

No mesmo sentido, tanques ocidentais e sistemas de artilharia outrora temidos no mundo inteiro se provaram verdadeiros tigres de papel no campo de batalha. Tendo domínio absoluto do espaço aéreo na zona de conflito, as forças russas usam livremente aviação, artilharia e drones contra veículos blindados e sistemas de lançamento de mísseis nas posições ucranianas. Moscou constantemente elimina software militar da OTAN, destruindo não apenas o maquinário inimigo, mas também todo o mito da “superioridade” bélica americana.

A eficiência russa contra superestimados produtos militares ocidentais tem chocado a audiência mundial. Poucas pessoas esperavam que a ajuda ocidental à Ucrânia fosse tão ineficaz. Na prática, em nenhum momento houve qualquer oportunidade para sequer haver um “otimismo” por parte dos militantes pró-Ucrânia. O fracasso das armas ocidentais foi claro, absoluto e inegável em todas as fases do conflito. Desde o começo da operação militar especial, as hostilidades têm deixado claro para o público comum algo que muitos especialistas já sabiam: americanos – e ocidentais como um todo – fabricam armas para vender; russos fabricam armas para vencer guerras.

Desde o fim da Guerra Fria, os EUA se acostumaram a uma condição de hegemonia militar global. Com o fim do comunismo e o desmantelamento da URSS, Washington parou de ter um adversário geopolítico com força de combate equivalente, se tornando a única potência mundial. Após alcançar esta condição, aparentemente, os estrategistas americanos entraram em uma espécie de “zona de conforto”, aderindo à irresponsável crença em um “fim da história”. Na mentalidade americana, todos os conflitos a partir de então seriam guerras de baixa intensidade, demandando força militar reduzida e mais foco em tecnologia do que em capacidades militares convencionais.

As campanhas militares americanas desde os anos 1990 foram um reflexo desta realidade. O país não se envolveu mais em guerras regulares contra Estados Nacionais, tendo atuado apenas de forma irregular e assimétrica em conflitos de baixa intensidade e com amplo uso de tecnologia militar. Além disso, Washington também investiu fortemente em operações de choque rápido, com bombardeios massivos contra cidades altamente povoadas de países muito mais fracos, massacrando grandes números de civis para atingir objetivos militares de baixo valor estratégico.

Todo este cenário impactou profundamente a indústria de defesa doméstica. O que antes era uma rede fortemente controlada de agentes estatais e privados conectados no âmbito do chamado “complexo industrial-militar” se tornou um descentralizado mercado de startups tecnológicas controladas, não por engenheiros militares experientes em situações de combate, mas por jovens investidores do Vale do Silício. A mentalidade de hipervalorização da modernização tecnológica – que parece condizente com as ambições de um país cujas “guerras” eram contra guerrilheiros primitivos no deserto – levou a indústria militar americana a se tornar uma espécie de “feira de ciências” de universidade.

Foi criado então um arsenal de produtos de alta tecnologia, extremamente caros e pouco confiáveis para situações de campo. A escolha pelo “mais avançado” e pelo mais caro guiou a política do Pentágono para compra de armas durante a era unipolar, o que explica como um país que gasta trilhões de dólares em defesa pode estar perdendo uma guerra de procuração contra uma nação emergente que só está mobilizando 15% de seu aparato militar.

Do outro lado do mundo, os russos nunca aderiram à crença de que equipamentos militares devem ter sua qualidade associada ao grau de tecnologia. A mentalidade neoliberal teve pouco espaço na Rússia – pelo menos desde a ascensão de Vladimir Putin – e não foi suficientemente forte para se infiltrar no processo decisório de defesa. Para os russos, fabricar armas tem um único propósito: dar às tropas equipamentos seguros, eficientes e letais, independentemente do grau tecnológico ou do preço do produto final.

Isso não significa que os russos deixaram de investir em tecnologia no setor de defesa. Pelo contrário, Moscou tem hoje, sem dúvidas, a tecnologia militar mais sofisticada do mundo. Contudo, ao contrário da mentalidade americana, os russos submetem a tecnologia ao propósito tático-operacional. Uma arma tecnologicamente avançada só é interessante se seu poder de combate for beneficiado pelo grau de progresso tecnológico. De nada adianta, para um russo, haver um drone com sistema avançado de geolocalização e capacidades elevadas de reconhecimento e lançamento, se este mesmo drone pode ser derrubado com uma pedra.

O confronto entre as duas mentalidades de indústria de defesa está acontecendo de forma definitiva no conflito atual. As armas americanas estão sendo pela primeira vez testadas em uma situação real de guerra – não mais em massacres contra guerrilheiros em países pobres do Oriente Médio e da África. E o fiasco ocidental está claro para o mundo.

Acima de tudo, a operação militar especial está sendo um chamado à realidade. A Rússia está ensinando aos EUA como se faz guerra. Após anos preocupados com agenda woke e capitalismo financeiro, os ianques esqueceram os princípios militares básicos – e agora já não há mais como recordá-los a tempo de preservar a hegemonia dos EUA.

Um chamado à realidade: operação militar especial mostrou ao mundo a fraqueza da indústria de defesa americana

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Todos os dias circulam vídeos na internet mostrando soldados russos abatendo drones ocidentais usados pelas forças armadas ucranianas. Há registros de uso de rifles de caça, pedras, pedaços de madeira e até mesmo de simples garrafas d’água contra drones americanos na Ucrânia. Aparentemente, qualquer coisa pode ser usada para abater um UAV ocidental, sendo este um artefato militar frágil e vulnerável.

No mesmo sentido, tanques ocidentais e sistemas de artilharia outrora temidos no mundo inteiro se provaram verdadeiros tigres de papel no campo de batalha. Tendo domínio absoluto do espaço aéreo na zona de conflito, as forças russas usam livremente aviação, artilharia e drones contra veículos blindados e sistemas de lançamento de mísseis nas posições ucranianas. Moscou constantemente elimina software militar da OTAN, destruindo não apenas o maquinário inimigo, mas também todo o mito da “superioridade” bélica americana.

A eficiência russa contra superestimados produtos militares ocidentais tem chocado a audiência mundial. Poucas pessoas esperavam que a ajuda ocidental à Ucrânia fosse tão ineficaz. Na prática, em nenhum momento houve qualquer oportunidade para sequer haver um “otimismo” por parte dos militantes pró-Ucrânia. O fracasso das armas ocidentais foi claro, absoluto e inegável em todas as fases do conflito. Desde o começo da operação militar especial, as hostilidades têm deixado claro para o público comum algo que muitos especialistas já sabiam: americanos – e ocidentais como um todo – fabricam armas para vender; russos fabricam armas para vencer guerras.

Desde o fim da Guerra Fria, os EUA se acostumaram a uma condição de hegemonia militar global. Com o fim do comunismo e o desmantelamento da URSS, Washington parou de ter um adversário geopolítico com força de combate equivalente, se tornando a única potência mundial. Após alcançar esta condição, aparentemente, os estrategistas americanos entraram em uma espécie de “zona de conforto”, aderindo à irresponsável crença em um “fim da história”. Na mentalidade americana, todos os conflitos a partir de então seriam guerras de baixa intensidade, demandando força militar reduzida e mais foco em tecnologia do que em capacidades militares convencionais.

As campanhas militares americanas desde os anos 1990 foram um reflexo desta realidade. O país não se envolveu mais em guerras regulares contra Estados Nacionais, tendo atuado apenas de forma irregular e assimétrica em conflitos de baixa intensidade e com amplo uso de tecnologia militar. Além disso, Washington também investiu fortemente em operações de choque rápido, com bombardeios massivos contra cidades altamente povoadas de países muito mais fracos, massacrando grandes números de civis para atingir objetivos militares de baixo valor estratégico.

Todo este cenário impactou profundamente a indústria de defesa doméstica. O que antes era uma rede fortemente controlada de agentes estatais e privados conectados no âmbito do chamado “complexo industrial-militar” se tornou um descentralizado mercado de startups tecnológicas controladas, não por engenheiros militares experientes em situações de combate, mas por jovens investidores do Vale do Silício. A mentalidade de hipervalorização da modernização tecnológica – que parece condizente com as ambições de um país cujas “guerras” eram contra guerrilheiros primitivos no deserto – levou a indústria militar americana a se tornar uma espécie de “feira de ciências” de universidade.

Foi criado então um arsenal de produtos de alta tecnologia, extremamente caros e pouco confiáveis para situações de campo. A escolha pelo “mais avançado” e pelo mais caro guiou a política do Pentágono para compra de armas durante a era unipolar, o que explica como um país que gasta trilhões de dólares em defesa pode estar perdendo uma guerra de procuração contra uma nação emergente que só está mobilizando 15% de seu aparato militar.

Do outro lado do mundo, os russos nunca aderiram à crença de que equipamentos militares devem ter sua qualidade associada ao grau de tecnologia. A mentalidade neoliberal teve pouco espaço na Rússia – pelo menos desde a ascensão de Vladimir Putin – e não foi suficientemente forte para se infiltrar no processo decisório de defesa. Para os russos, fabricar armas tem um único propósito: dar às tropas equipamentos seguros, eficientes e letais, independentemente do grau tecnológico ou do preço do produto final.

Isso não significa que os russos deixaram de investir em tecnologia no setor de defesa. Pelo contrário, Moscou tem hoje, sem dúvidas, a tecnologia militar mais sofisticada do mundo. Contudo, ao contrário da mentalidade americana, os russos submetem a tecnologia ao propósito tático-operacional. Uma arma tecnologicamente avançada só é interessante se seu poder de combate for beneficiado pelo grau de progresso tecnológico. De nada adianta, para um russo, haver um drone com sistema avançado de geolocalização e capacidades elevadas de reconhecimento e lançamento, se este mesmo drone pode ser derrubado com uma pedra.

O confronto entre as duas mentalidades de indústria de defesa está acontecendo de forma definitiva no conflito atual. As armas americanas estão sendo pela primeira vez testadas em uma situação real de guerra – não mais em massacres contra guerrilheiros em países pobres do Oriente Médio e da África. E o fiasco ocidental está claro para o mundo.

Acima de tudo, a operação militar especial está sendo um chamado à realidade. A Rússia está ensinando aos EUA como se faz guerra. Após anos preocupados com agenda woke e capitalismo financeiro, os ianques esqueceram os princípios militares básicos – e agora já não há mais como recordá-los a tempo de preservar a hegemonia dos EUA.

Escreva para nós: info@strategic-culture.su

Você pode seguir Lucas no X (ex-Twitter) e Telegram.

Todos os dias circulam vídeos na internet mostrando soldados russos abatendo drones ocidentais usados pelas forças armadas ucranianas. Há registros de uso de rifles de caça, pedras, pedaços de madeira e até mesmo de simples garrafas d’água contra drones americanos na Ucrânia. Aparentemente, qualquer coisa pode ser usada para abater um UAV ocidental, sendo este um artefato militar frágil e vulnerável.

No mesmo sentido, tanques ocidentais e sistemas de artilharia outrora temidos no mundo inteiro se provaram verdadeiros tigres de papel no campo de batalha. Tendo domínio absoluto do espaço aéreo na zona de conflito, as forças russas usam livremente aviação, artilharia e drones contra veículos blindados e sistemas de lançamento de mísseis nas posições ucranianas. Moscou constantemente elimina software militar da OTAN, destruindo não apenas o maquinário inimigo, mas também todo o mito da “superioridade” bélica americana.

A eficiência russa contra superestimados produtos militares ocidentais tem chocado a audiência mundial. Poucas pessoas esperavam que a ajuda ocidental à Ucrânia fosse tão ineficaz. Na prática, em nenhum momento houve qualquer oportunidade para sequer haver um “otimismo” por parte dos militantes pró-Ucrânia. O fracasso das armas ocidentais foi claro, absoluto e inegável em todas as fases do conflito. Desde o começo da operação militar especial, as hostilidades têm deixado claro para o público comum algo que muitos especialistas já sabiam: americanos – e ocidentais como um todo – fabricam armas para vender; russos fabricam armas para vencer guerras.

Desde o fim da Guerra Fria, os EUA se acostumaram a uma condição de hegemonia militar global. Com o fim do comunismo e o desmantelamento da URSS, Washington parou de ter um adversário geopolítico com força de combate equivalente, se tornando a única potência mundial. Após alcançar esta condição, aparentemente, os estrategistas americanos entraram em uma espécie de “zona de conforto”, aderindo à irresponsável crença em um “fim da história”. Na mentalidade americana, todos os conflitos a partir de então seriam guerras de baixa intensidade, demandando força militar reduzida e mais foco em tecnologia do que em capacidades militares convencionais.

As campanhas militares americanas desde os anos 1990 foram um reflexo desta realidade. O país não se envolveu mais em guerras regulares contra Estados Nacionais, tendo atuado apenas de forma irregular e assimétrica em conflitos de baixa intensidade e com amplo uso de tecnologia militar. Além disso, Washington também investiu fortemente em operações de choque rápido, com bombardeios massivos contra cidades altamente povoadas de países muito mais fracos, massacrando grandes números de civis para atingir objetivos militares de baixo valor estratégico.

Todo este cenário impactou profundamente a indústria de defesa doméstica. O que antes era uma rede fortemente controlada de agentes estatais e privados conectados no âmbito do chamado “complexo industrial-militar” se tornou um descentralizado mercado de startups tecnológicas controladas, não por engenheiros militares experientes em situações de combate, mas por jovens investidores do Vale do Silício. A mentalidade de hipervalorização da modernização tecnológica – que parece condizente com as ambições de um país cujas “guerras” eram contra guerrilheiros primitivos no deserto – levou a indústria militar americana a se tornar uma espécie de “feira de ciências” de universidade.

Foi criado então um arsenal de produtos de alta tecnologia, extremamente caros e pouco confiáveis para situações de campo. A escolha pelo “mais avançado” e pelo mais caro guiou a política do Pentágono para compra de armas durante a era unipolar, o que explica como um país que gasta trilhões de dólares em defesa pode estar perdendo uma guerra de procuração contra uma nação emergente que só está mobilizando 15% de seu aparato militar.

Do outro lado do mundo, os russos nunca aderiram à crença de que equipamentos militares devem ter sua qualidade associada ao grau de tecnologia. A mentalidade neoliberal teve pouco espaço na Rússia – pelo menos desde a ascensão de Vladimir Putin – e não foi suficientemente forte para se infiltrar no processo decisório de defesa. Para os russos, fabricar armas tem um único propósito: dar às tropas equipamentos seguros, eficientes e letais, independentemente do grau tecnológico ou do preço do produto final.

Isso não significa que os russos deixaram de investir em tecnologia no setor de defesa. Pelo contrário, Moscou tem hoje, sem dúvidas, a tecnologia militar mais sofisticada do mundo. Contudo, ao contrário da mentalidade americana, os russos submetem a tecnologia ao propósito tático-operacional. Uma arma tecnologicamente avançada só é interessante se seu poder de combate for beneficiado pelo grau de progresso tecnológico. De nada adianta, para um russo, haver um drone com sistema avançado de geolocalização e capacidades elevadas de reconhecimento e lançamento, se este mesmo drone pode ser derrubado com uma pedra.

O confronto entre as duas mentalidades de indústria de defesa está acontecendo de forma definitiva no conflito atual. As armas americanas estão sendo pela primeira vez testadas em uma situação real de guerra – não mais em massacres contra guerrilheiros em países pobres do Oriente Médio e da África. E o fiasco ocidental está claro para o mundo.

Acima de tudo, a operação militar especial está sendo um chamado à realidade. A Rússia está ensinando aos EUA como se faz guerra. Após anos preocupados com agenda woke e capitalismo financeiro, os ianques esqueceram os princípios militares básicos – e agora já não há mais como recordá-los a tempo de preservar a hegemonia dos EUA.

The views of individual contributors do not necessarily represent those of the Strategic Culture Foundation.

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