Português
Alastair Crooke
July 19, 2023
© Photo: SCF

A convicção ocidental de que a fragilidade da Rússia é explicada por seu afastamento das doutrinas econômicas ‘anglo’ reflete uma ilusão.

O caos que os ‘especialistas’ ocidentais esperavam, ‘com entusiasmo libidinoso’, se desenrolaria na Rússia “que certamente apresentaria “russos… matando russos” e com Putin “provavelmente escondido em algum lugar” – veio – só que explodiu na França, onde não era esperado, com Macron na corda bamba ao invés de ser Putin em Moscou.

Há muito a ser destilado dessa interessante inversão de expectativas e de eventos – de um conto sobre duas insurreições muito diferentes:

Na tarde de sábado, depois que Prigozhin chegou a Rostov, surgiram notícias nos Estados Unidos de que Prigozhin havia fechado um acordo com o presidente Lukashenko para encerrar seu protesto e ir para a Bielorrússia. Assim o caso terminou em grande parte sem sangue derramado. Nenhum apoio foi dado a Prigozhin, nem da classe política nem dos militares. O establishment ocidental ficou titubeante; suas expectativas aparentemente inexplicavelmente esmagadas, em poucas horas.

Igualmente chocantes para o Ocidente, no entanto, foram os vídeos vindos de Paris e de cidades por toda a França. Carros queimando; delegacias de polícia e prédios municipais em chamas; a polícia atacou e lojas amplamente arrombadas e saqueadas. Essas eram cenas, como se fossem tiradas de ‘A Queda da Roma Imperial’.

No final das contas, essa insurreição também desapareceu. No entanto, não foi nada como o desaparecimento do ‘motim’ de Prigozhin, que terminou com uma demonstração de apoio ao Estado russo per se e ao presidente Putin, pessoalmente.

Na insurreição francesa, precisamente nada foi ‘resolvido’ – o Estado sendo visto como ‘além de conserto’ em sua iteração atual: Uma República não mais. E a posição pessoal do presidente Macron permaneceu insultada, possivelmente além da reabilitação.

Ao contrário da instância russa, o presidente francês viu grande parte da polícia se voltar contra ele (com o sindicato da polícia emitindo uma declaração que cheirava a iminência de guerra civil, com os manifestantes rotulados de ‘vermes’). Os generais do Exército também alertaram Macron para ‘controlar’ a situação ou seriam forçados a fazê-lo.

Claramente – mesmo que por apenas nove dias – os meios de execução da Lei do Estado viraram as costas para o Chefe de Estado. Toda a história nos diz que um líder que perdeu o apoio de seus agentes executores pode perder-se logo também (na próxima insurreição).

Este motim dos banlieues é facilmente descartado como uma ferida antiga de origem argelina/marroquina ressurgindo, mais uma vez. É verdade que o assassinato de um jovem de origem norte-africana foi o estopim imediato de tumultos em várias cidades – todas em alvoroço em uma hora.

Para aqueles que desejam descartar qualquer significado mais amplo (apesar dos protestos em massa anteriores não serem dos banlieusards), ele é descartado, com murmúrios de como os franceses estão de alguma forma propensos a ir para as ruas!

Falando francamente, o problema subjacente que a França acabou de revelar é a crise pan-europeia – de longa fermentação – para a qual não há soluções prontas. É uma crise que ameaça toda a Europa.

Os comentaristas, no entanto, são rápidos em sugerir que os protestos de rua (como os da França) não podem ameaçar um Estado europeu – os protestos lá foram difusos e sem um núcleo político.

Stephen Kotkin, no entanto, escreveu um livro Uncivil Society em resposta ao mito prevalente de que sem uma sociedade civil paralela organizada, se opondo e finalmente deslocando o regime, os estados da UE estão perfeitamente seguros e podem ‘continuar’ ignorando a raiva popular.

A tese de Kotkin é que os regimes comunistas caíram, não apenas inesperada e basicamente da noite para o dia, e (exceto na Polônia) sem a existência prévia de qualquer oposição organizada. É um mito completo que o comunismo caiu como resultado de uma sociedade civil oposta, ele escreve. O mito persiste, no entanto, dentro de um Ocidente que cria ativamente sociedades civis de oposição em prol de seus objetivos de mudança de regime.

Em vez disso, a única estrutura organizada na Europa Oriental comunista era a Nomenklatura governante. Kotkin estima essa burocracia tecnocrática dominante em cerca de cinco a sete por cento da população. Essas pessoas interagiam umas com as outras diariamente e formavam a entidade coerente que tinha poder real. Eles viviam uma realidade paralela privilegiada, totalmente alijada do mundo ao seu redor, que ditava todos os aspectos da vida em seu próprio benefício – até que um dia isso não aconteceu. Foi essa tecnocracia que entrou em colapso em 1989.

O que causou a queda repentina desses Estados? A resposta curta de Kotkin é uma queda de confiança em cascata: uma “corrida política aos bancos”. E o evento crucial na derrubada de todos os governos comunistas foi o protesto de rua. Assim, os eventos de 1989 surpreenderam totalmente todo o Ocidente devido à falta de oposição política organizada.

O ponto aqui, é claro, é que a tecnocracia europeia de hoje, habitando suas políticas extremas de gênero, diversidade e realidades verdes paralelas (à da maioria dos europeus), presunçosamente assume que com o controle da Narrativa, eles podem suprimir protestos e impor um futuro Fórum Econômico Mundial que apaga identidades e culturas nacionais sem impedimentos.

O que está acontecendo na França – de diversas formas – é precisamente uma “corrida aos bancos política” do presidente francês. E o que está acontecendo na França, no entanto, pode se espalhar…

Claro, protestos de rua em Estados comunistas já aconteceram antes. O que era diferente em 1989, argumenta Kotkin, era a extrema fragilidade do regime. Os dois impulsionadores imediatos – além da simples incompetência e esclerose – foram a recusa de Mikhail Gorbachev (como Macron durante esta recente insurreição) em parar uma repressão, além do fracassado esquema econômico Ponzi em que todos esses Estados se envolveram (empréstimo em moeda forte do Ocidente para sustentar suas economias).

É aqui que podemos entender por que os eventos recentes na França são tão graves e afetam mais amplamente. Pois, perversamente, a Europa está trilhando essencialmente o mesmo caminho (com características ocidentais) que o Leste Europeu trilhou.

No final das duas Guerras Mundiais, os europeus ocidentais buscavam uma sociedade mais justa (a sociedade industrial que precedeu as guerras era francamente feudal e brutal). Os europeus queriam um novo acordo que também cuidasse dos menos favorecidos. Não era o socialismo em si que se buscava, embora alguns claramente desejassem o comunismo. Essencialmente, tratava-se de reinserir alguns valores éticos em uma esfera econômica de laissez-faire amoral.

Não funcionou bem. O sistema cresceu, até que os Estados ocidentais não podiam mais se sustentar. A dívida disparou. E então, na década de 1980, um aparente ‘remédio’ – importado da Escola de Chicago de fanáticos neoliberais, pregando o desgaste da infraestrutura social e a financeirização da economia – foi amplamente adotado.

Os proselitistas de Chicago disseram à PM Thatcher para parar de construir navios ou fabricar carros – isso era para a Ásia. A ‘indústria’ de serviços financeiros era a galinha dos ovos de ouro no futuro.

A cura provou ser ‘pior que a doença’. Paradoxalmente, a falha desse enigma econômico em desenvolvimento foi percebida por Friedrich List e pela Escola Alemã de Economia, já no século XIX. Ele viu a falha no modelo ‘Anglo’ liderado pela dívida e baseado no consumo: que (em poucas palavras) o bem-estar de uma sociedade e sua riqueza geral são determinados não pelo que a sociedade pode comprar, mas pelo que ela pode fazer.

List previu que uma virada para a valorização do consumo – acima de cuidar da construção da economia real – inevitavelmente levaria a uma atenuação da economia real: à medida que o consumo e um efêmero setor financeiro e de serviços sugavam o ‘oxigênio’ de novos investimentos da manufatura da produção real (ainda necessária para pagar as importações), a economia real definharia.

A autossuficiência seria corroída e uma base cada vez menor de criação de riqueza real sustentaria números cada vez menores em empregos adequadamente remunerados. E uma dívida cada vez maior se tornaria necessária para sustentar um grupo cada vez menor de empregados produtivos. Isso representa o ‘Conto da França’.

Nos EUA hoje, por exemplo, os números oficialmente de desempregados são 6,1 milhões de americanos; ainda assim, 99,8 milhões de americanos em idade ativa são considerados “fora da força de trabalho”. Assim, um total de 105 milhões de americanos em idade produtiva não têm emprego hoje.

Esta é a mesma ‘armadilha’ que afeta a França (e grande parte da Europa). A inflação está subindo; a economia real está se contraindo; e o emprego bem remunerado encolhendo – ao mesmo tempo em que o tecido de apoio foi eviscerado (por razões ideológicas).

É sombrio. O aumento da imigração para a Europa agrava o problema. Todos podem ver isso, exceto a Nomenklatura europeia que permanece na negação ideológica da ‘sociedade aberta’.

Aqui está o problema: não há soluções. Desfazer as contradições estruturais desse modelo de Chicago está além das atuais capacidades políticas ocidentais.

A Esquerda não tem solução, e a Direita não pode opinar – Zugzwang (xeque-mate).

O que nos traz de volta ao ‘Conto sobre as Duas Cidades’ e suas experiências de insurgência muito diferentes: Na França, não há solução. Na Rússia, Putin e milhões de outros experimentaram a “terapia de choque” da liberação de preços e do hiperfinanceiro durante os anos Yeltsin.

E Putin ‘entendeu’. Como List previu, o modelo financeirizado ‘Anglo’ corroeu a autossuficiência nacional e encolheu a base da criação real de riqueza, que fornecia os empregos necessários para sustentar a população russa com trabalho.

Muitas pessoas perderam seus empregos durante os anos Yeltsin; não foram pagas; e viram o valor real de seus ganhos despencar – enquanto oligarcas pipocavam aparentemente do ar e vinham saquear qualquer instituição que tivesse valor. Houve hiperinflação, gangsterismo, corrupção, corridas monetárias, fuga de capitais, pobreza desesperadora, aumento do alcoolismo, declínio da saúde e exibições vulgares e esbanjadoras de riqueza por parte dos super-ricos.

No entanto, a principal influência sobre Putin veio do presidente Xi. Este último havia deixado claro, em uma análise contundente intitulada “Por que a União Soviética se desintegrou?”, que o repúdio soviético à história do PCUS de Lênin, de Stálin, “foi destruir ao caos a ideologia soviética e engajar em niilismo histórico”.

Xi argumentou que, dados os dois polos de antinomia ideológica – o da construção anglo-americana, por um lado, e a crítica escatológica leninista do sistema econômico ocidental, por outro – os “estratos dominantes soviéticos deixaram de acreditar” no último e, consequentemente, caíram em um estado de niilismo (com o pivô para a ideologia do mercado liberal ocidental da era Gorbachev-Yeltsin).

O ponto de Xi foi claro: a China nunca havia feito esse desvio. Em termos simples, para Xi, o desastre econômico de Yeltsin foi o resultado da virada para o liberalismo ocidental. E Putin concordou.

Nas palavras de Putin, a China “conseguiu da melhor maneira possível, na minha opinião, usar as alavancas da administração central (para) o desenvolvimento de uma economia de mercado… A União Soviética não fez nada disso, e os resultados de uma política econômica ineficaz impactou a esfera política”.

Mas isso é precisamente o que a Rússia, sob Putin, corrigiu. Misturar a ideologia de Lênin com os insights econômicos de List (um seguidor de List, o conde Sergei Witte foi primeiro-ministro na Rússia do século XIX) tornou a Rússia autossuficiente.

O Ocidente não a vê dessa forma. Este último persiste em ver a Rússia como um Estado frágil e friável, tão em dificuldades financeiras que qualquer reversão na frente de batalha ucraniana poderia provocar um colapso financeiro em pânico (como visto em 1998) e anarquia política em Moscou, semelhante à da era Yeltsin.

Com base nessa análise falha e absurda, o Ocidente lançou uma guerra contra a Rússia via Ucrânia. A estratégia de guerra sempre se baseou na fragilidade política e econômica russa (e em um exército atolado em rígidas estruturas de comando de estilo soviético).

A guerra pode ser atribuída em grande parte a essa falha em entender a forte convicção de Xi e Putin de que a devastação de Yeltsin foi o resultado inevitável da virada para o liberalismo ocidental. E que essa falha exigia uma correção ajustada, o que Putin fez devidamente – mas que o Ocidente não percebeu.

Os EUA, no entanto, persistem, contra as evidências, na convicção de que a fragilidade inerente da Rússia é explicada por seu afastamento das doutrinas econômicas ‘anglo’. Isso reflete a pura ilusão ocidental.

A maioria dos russos, por outro lado, atribui a resiliência da Rússia diante de um ataque financeiro ocidental combinado como explicável, porque Putin, em grande parte, levou a Rússia à autossuficiência, fora da esfera econômica ocidental dominada pelos EUA.

Assim, o paradoxo é explicado: Diante da ‘insurgência’ de Prigozhin, os russos expressaram sua confiança e apoio ao Estado russo. Já na insurgência francesa, o povo expressou descontentamento e raiva pela ‘armadilha’ em que se encontra. A corrida política ao ‘banco’ Macron está em andamento.

Traducao: Comunidad Saker Latinoamerica

Um conto sobre duas cidades

A convicção ocidental de que a fragilidade da Rússia é explicada por seu afastamento das doutrinas econômicas ‘anglo’ reflete uma ilusão.

O caos que os ‘especialistas’ ocidentais esperavam, ‘com entusiasmo libidinoso’, se desenrolaria na Rússia “que certamente apresentaria “russos… matando russos” e com Putin “provavelmente escondido em algum lugar” – veio – só que explodiu na França, onde não era esperado, com Macron na corda bamba ao invés de ser Putin em Moscou.

Há muito a ser destilado dessa interessante inversão de expectativas e de eventos – de um conto sobre duas insurreições muito diferentes:

Na tarde de sábado, depois que Prigozhin chegou a Rostov, surgiram notícias nos Estados Unidos de que Prigozhin havia fechado um acordo com o presidente Lukashenko para encerrar seu protesto e ir para a Bielorrússia. Assim o caso terminou em grande parte sem sangue derramado. Nenhum apoio foi dado a Prigozhin, nem da classe política nem dos militares. O establishment ocidental ficou titubeante; suas expectativas aparentemente inexplicavelmente esmagadas, em poucas horas.

Igualmente chocantes para o Ocidente, no entanto, foram os vídeos vindos de Paris e de cidades por toda a França. Carros queimando; delegacias de polícia e prédios municipais em chamas; a polícia atacou e lojas amplamente arrombadas e saqueadas. Essas eram cenas, como se fossem tiradas de ‘A Queda da Roma Imperial’.

No final das contas, essa insurreição também desapareceu. No entanto, não foi nada como o desaparecimento do ‘motim’ de Prigozhin, que terminou com uma demonstração de apoio ao Estado russo per se e ao presidente Putin, pessoalmente.

Na insurreição francesa, precisamente nada foi ‘resolvido’ – o Estado sendo visto como ‘além de conserto’ em sua iteração atual: Uma República não mais. E a posição pessoal do presidente Macron permaneceu insultada, possivelmente além da reabilitação.

Ao contrário da instância russa, o presidente francês viu grande parte da polícia se voltar contra ele (com o sindicato da polícia emitindo uma declaração que cheirava a iminência de guerra civil, com os manifestantes rotulados de ‘vermes’). Os generais do Exército também alertaram Macron para ‘controlar’ a situação ou seriam forçados a fazê-lo.

Claramente – mesmo que por apenas nove dias – os meios de execução da Lei do Estado viraram as costas para o Chefe de Estado. Toda a história nos diz que um líder que perdeu o apoio de seus agentes executores pode perder-se logo também (na próxima insurreição).

Este motim dos banlieues é facilmente descartado como uma ferida antiga de origem argelina/marroquina ressurgindo, mais uma vez. É verdade que o assassinato de um jovem de origem norte-africana foi o estopim imediato de tumultos em várias cidades – todas em alvoroço em uma hora.

Para aqueles que desejam descartar qualquer significado mais amplo (apesar dos protestos em massa anteriores não serem dos banlieusards), ele é descartado, com murmúrios de como os franceses estão de alguma forma propensos a ir para as ruas!

Falando francamente, o problema subjacente que a França acabou de revelar é a crise pan-europeia – de longa fermentação – para a qual não há soluções prontas. É uma crise que ameaça toda a Europa.

Os comentaristas, no entanto, são rápidos em sugerir que os protestos de rua (como os da França) não podem ameaçar um Estado europeu – os protestos lá foram difusos e sem um núcleo político.

Stephen Kotkin, no entanto, escreveu um livro Uncivil Society em resposta ao mito prevalente de que sem uma sociedade civil paralela organizada, se opondo e finalmente deslocando o regime, os estados da UE estão perfeitamente seguros e podem ‘continuar’ ignorando a raiva popular.

A tese de Kotkin é que os regimes comunistas caíram, não apenas inesperada e basicamente da noite para o dia, e (exceto na Polônia) sem a existência prévia de qualquer oposição organizada. É um mito completo que o comunismo caiu como resultado de uma sociedade civil oposta, ele escreve. O mito persiste, no entanto, dentro de um Ocidente que cria ativamente sociedades civis de oposição em prol de seus objetivos de mudança de regime.

Em vez disso, a única estrutura organizada na Europa Oriental comunista era a Nomenklatura governante. Kotkin estima essa burocracia tecnocrática dominante em cerca de cinco a sete por cento da população. Essas pessoas interagiam umas com as outras diariamente e formavam a entidade coerente que tinha poder real. Eles viviam uma realidade paralela privilegiada, totalmente alijada do mundo ao seu redor, que ditava todos os aspectos da vida em seu próprio benefício – até que um dia isso não aconteceu. Foi essa tecnocracia que entrou em colapso em 1989.

O que causou a queda repentina desses Estados? A resposta curta de Kotkin é uma queda de confiança em cascata: uma “corrida política aos bancos”. E o evento crucial na derrubada de todos os governos comunistas foi o protesto de rua. Assim, os eventos de 1989 surpreenderam totalmente todo o Ocidente devido à falta de oposição política organizada.

O ponto aqui, é claro, é que a tecnocracia europeia de hoje, habitando suas políticas extremas de gênero, diversidade e realidades verdes paralelas (à da maioria dos europeus), presunçosamente assume que com o controle da Narrativa, eles podem suprimir protestos e impor um futuro Fórum Econômico Mundial que apaga identidades e culturas nacionais sem impedimentos.

O que está acontecendo na França – de diversas formas – é precisamente uma “corrida aos bancos política” do presidente francês. E o que está acontecendo na França, no entanto, pode se espalhar…

Claro, protestos de rua em Estados comunistas já aconteceram antes. O que era diferente em 1989, argumenta Kotkin, era a extrema fragilidade do regime. Os dois impulsionadores imediatos – além da simples incompetência e esclerose – foram a recusa de Mikhail Gorbachev (como Macron durante esta recente insurreição) em parar uma repressão, além do fracassado esquema econômico Ponzi em que todos esses Estados se envolveram (empréstimo em moeda forte do Ocidente para sustentar suas economias).

É aqui que podemos entender por que os eventos recentes na França são tão graves e afetam mais amplamente. Pois, perversamente, a Europa está trilhando essencialmente o mesmo caminho (com características ocidentais) que o Leste Europeu trilhou.

No final das duas Guerras Mundiais, os europeus ocidentais buscavam uma sociedade mais justa (a sociedade industrial que precedeu as guerras era francamente feudal e brutal). Os europeus queriam um novo acordo que também cuidasse dos menos favorecidos. Não era o socialismo em si que se buscava, embora alguns claramente desejassem o comunismo. Essencialmente, tratava-se de reinserir alguns valores éticos em uma esfera econômica de laissez-faire amoral.

Não funcionou bem. O sistema cresceu, até que os Estados ocidentais não podiam mais se sustentar. A dívida disparou. E então, na década de 1980, um aparente ‘remédio’ – importado da Escola de Chicago de fanáticos neoliberais, pregando o desgaste da infraestrutura social e a financeirização da economia – foi amplamente adotado.

Os proselitistas de Chicago disseram à PM Thatcher para parar de construir navios ou fabricar carros – isso era para a Ásia. A ‘indústria’ de serviços financeiros era a galinha dos ovos de ouro no futuro.

A cura provou ser ‘pior que a doença’. Paradoxalmente, a falha desse enigma econômico em desenvolvimento foi percebida por Friedrich List e pela Escola Alemã de Economia, já no século XIX. Ele viu a falha no modelo ‘Anglo’ liderado pela dívida e baseado no consumo: que (em poucas palavras) o bem-estar de uma sociedade e sua riqueza geral são determinados não pelo que a sociedade pode comprar, mas pelo que ela pode fazer.

List previu que uma virada para a valorização do consumo – acima de cuidar da construção da economia real – inevitavelmente levaria a uma atenuação da economia real: à medida que o consumo e um efêmero setor financeiro e de serviços sugavam o ‘oxigênio’ de novos investimentos da manufatura da produção real (ainda necessária para pagar as importações), a economia real definharia.

A autossuficiência seria corroída e uma base cada vez menor de criação de riqueza real sustentaria números cada vez menores em empregos adequadamente remunerados. E uma dívida cada vez maior se tornaria necessária para sustentar um grupo cada vez menor de empregados produtivos. Isso representa o ‘Conto da França’.

Nos EUA hoje, por exemplo, os números oficialmente de desempregados são 6,1 milhões de americanos; ainda assim, 99,8 milhões de americanos em idade ativa são considerados “fora da força de trabalho”. Assim, um total de 105 milhões de americanos em idade produtiva não têm emprego hoje.

Esta é a mesma ‘armadilha’ que afeta a França (e grande parte da Europa). A inflação está subindo; a economia real está se contraindo; e o emprego bem remunerado encolhendo – ao mesmo tempo em que o tecido de apoio foi eviscerado (por razões ideológicas).

É sombrio. O aumento da imigração para a Europa agrava o problema. Todos podem ver isso, exceto a Nomenklatura europeia que permanece na negação ideológica da ‘sociedade aberta’.

Aqui está o problema: não há soluções. Desfazer as contradições estruturais desse modelo de Chicago está além das atuais capacidades políticas ocidentais.

A Esquerda não tem solução, e a Direita não pode opinar – Zugzwang (xeque-mate).

O que nos traz de volta ao ‘Conto sobre as Duas Cidades’ e suas experiências de insurgência muito diferentes: Na França, não há solução. Na Rússia, Putin e milhões de outros experimentaram a “terapia de choque” da liberação de preços e do hiperfinanceiro durante os anos Yeltsin.

E Putin ‘entendeu’. Como List previu, o modelo financeirizado ‘Anglo’ corroeu a autossuficiência nacional e encolheu a base da criação real de riqueza, que fornecia os empregos necessários para sustentar a população russa com trabalho.

Muitas pessoas perderam seus empregos durante os anos Yeltsin; não foram pagas; e viram o valor real de seus ganhos despencar – enquanto oligarcas pipocavam aparentemente do ar e vinham saquear qualquer instituição que tivesse valor. Houve hiperinflação, gangsterismo, corrupção, corridas monetárias, fuga de capitais, pobreza desesperadora, aumento do alcoolismo, declínio da saúde e exibições vulgares e esbanjadoras de riqueza por parte dos super-ricos.

No entanto, a principal influência sobre Putin veio do presidente Xi. Este último havia deixado claro, em uma análise contundente intitulada “Por que a União Soviética se desintegrou?”, que o repúdio soviético à história do PCUS de Lênin, de Stálin, “foi destruir ao caos a ideologia soviética e engajar em niilismo histórico”.

Xi argumentou que, dados os dois polos de antinomia ideológica – o da construção anglo-americana, por um lado, e a crítica escatológica leninista do sistema econômico ocidental, por outro – os “estratos dominantes soviéticos deixaram de acreditar” no último e, consequentemente, caíram em um estado de niilismo (com o pivô para a ideologia do mercado liberal ocidental da era Gorbachev-Yeltsin).

O ponto de Xi foi claro: a China nunca havia feito esse desvio. Em termos simples, para Xi, o desastre econômico de Yeltsin foi o resultado da virada para o liberalismo ocidental. E Putin concordou.

Nas palavras de Putin, a China “conseguiu da melhor maneira possível, na minha opinião, usar as alavancas da administração central (para) o desenvolvimento de uma economia de mercado… A União Soviética não fez nada disso, e os resultados de uma política econômica ineficaz impactou a esfera política”.

Mas isso é precisamente o que a Rússia, sob Putin, corrigiu. Misturar a ideologia de Lênin com os insights econômicos de List (um seguidor de List, o conde Sergei Witte foi primeiro-ministro na Rússia do século XIX) tornou a Rússia autossuficiente.

O Ocidente não a vê dessa forma. Este último persiste em ver a Rússia como um Estado frágil e friável, tão em dificuldades financeiras que qualquer reversão na frente de batalha ucraniana poderia provocar um colapso financeiro em pânico (como visto em 1998) e anarquia política em Moscou, semelhante à da era Yeltsin.

Com base nessa análise falha e absurda, o Ocidente lançou uma guerra contra a Rússia via Ucrânia. A estratégia de guerra sempre se baseou na fragilidade política e econômica russa (e em um exército atolado em rígidas estruturas de comando de estilo soviético).

A guerra pode ser atribuída em grande parte a essa falha em entender a forte convicção de Xi e Putin de que a devastação de Yeltsin foi o resultado inevitável da virada para o liberalismo ocidental. E que essa falha exigia uma correção ajustada, o que Putin fez devidamente – mas que o Ocidente não percebeu.

Os EUA, no entanto, persistem, contra as evidências, na convicção de que a fragilidade inerente da Rússia é explicada por seu afastamento das doutrinas econômicas ‘anglo’. Isso reflete a pura ilusão ocidental.

A maioria dos russos, por outro lado, atribui a resiliência da Rússia diante de um ataque financeiro ocidental combinado como explicável, porque Putin, em grande parte, levou a Rússia à autossuficiência, fora da esfera econômica ocidental dominada pelos EUA.

Assim, o paradoxo é explicado: Diante da ‘insurgência’ de Prigozhin, os russos expressaram sua confiança e apoio ao Estado russo. Já na insurgência francesa, o povo expressou descontentamento e raiva pela ‘armadilha’ em que se encontra. A corrida política ao ‘banco’ Macron está em andamento.

Traducao: Comunidad Saker Latinoamerica

A convicção ocidental de que a fragilidade da Rússia é explicada por seu afastamento das doutrinas econômicas ‘anglo’ reflete uma ilusão.

O caos que os ‘especialistas’ ocidentais esperavam, ‘com entusiasmo libidinoso’, se desenrolaria na Rússia “que certamente apresentaria “russos… matando russos” e com Putin “provavelmente escondido em algum lugar” – veio – só que explodiu na França, onde não era esperado, com Macron na corda bamba ao invés de ser Putin em Moscou.

Há muito a ser destilado dessa interessante inversão de expectativas e de eventos – de um conto sobre duas insurreições muito diferentes:

Na tarde de sábado, depois que Prigozhin chegou a Rostov, surgiram notícias nos Estados Unidos de que Prigozhin havia fechado um acordo com o presidente Lukashenko para encerrar seu protesto e ir para a Bielorrússia. Assim o caso terminou em grande parte sem sangue derramado. Nenhum apoio foi dado a Prigozhin, nem da classe política nem dos militares. O establishment ocidental ficou titubeante; suas expectativas aparentemente inexplicavelmente esmagadas, em poucas horas.

Igualmente chocantes para o Ocidente, no entanto, foram os vídeos vindos de Paris e de cidades por toda a França. Carros queimando; delegacias de polícia e prédios municipais em chamas; a polícia atacou e lojas amplamente arrombadas e saqueadas. Essas eram cenas, como se fossem tiradas de ‘A Queda da Roma Imperial’.

No final das contas, essa insurreição também desapareceu. No entanto, não foi nada como o desaparecimento do ‘motim’ de Prigozhin, que terminou com uma demonstração de apoio ao Estado russo per se e ao presidente Putin, pessoalmente.

Na insurreição francesa, precisamente nada foi ‘resolvido’ – o Estado sendo visto como ‘além de conserto’ em sua iteração atual: Uma República não mais. E a posição pessoal do presidente Macron permaneceu insultada, possivelmente além da reabilitação.

Ao contrário da instância russa, o presidente francês viu grande parte da polícia se voltar contra ele (com o sindicato da polícia emitindo uma declaração que cheirava a iminência de guerra civil, com os manifestantes rotulados de ‘vermes’). Os generais do Exército também alertaram Macron para ‘controlar’ a situação ou seriam forçados a fazê-lo.

Claramente – mesmo que por apenas nove dias – os meios de execução da Lei do Estado viraram as costas para o Chefe de Estado. Toda a história nos diz que um líder que perdeu o apoio de seus agentes executores pode perder-se logo também (na próxima insurreição).

Este motim dos banlieues é facilmente descartado como uma ferida antiga de origem argelina/marroquina ressurgindo, mais uma vez. É verdade que o assassinato de um jovem de origem norte-africana foi o estopim imediato de tumultos em várias cidades – todas em alvoroço em uma hora.

Para aqueles que desejam descartar qualquer significado mais amplo (apesar dos protestos em massa anteriores não serem dos banlieusards), ele é descartado, com murmúrios de como os franceses estão de alguma forma propensos a ir para as ruas!

Falando francamente, o problema subjacente que a França acabou de revelar é a crise pan-europeia – de longa fermentação – para a qual não há soluções prontas. É uma crise que ameaça toda a Europa.

Os comentaristas, no entanto, são rápidos em sugerir que os protestos de rua (como os da França) não podem ameaçar um Estado europeu – os protestos lá foram difusos e sem um núcleo político.

Stephen Kotkin, no entanto, escreveu um livro Uncivil Society em resposta ao mito prevalente de que sem uma sociedade civil paralela organizada, se opondo e finalmente deslocando o regime, os estados da UE estão perfeitamente seguros e podem ‘continuar’ ignorando a raiva popular.

A tese de Kotkin é que os regimes comunistas caíram, não apenas inesperada e basicamente da noite para o dia, e (exceto na Polônia) sem a existência prévia de qualquer oposição organizada. É um mito completo que o comunismo caiu como resultado de uma sociedade civil oposta, ele escreve. O mito persiste, no entanto, dentro de um Ocidente que cria ativamente sociedades civis de oposição em prol de seus objetivos de mudança de regime.

Em vez disso, a única estrutura organizada na Europa Oriental comunista era a Nomenklatura governante. Kotkin estima essa burocracia tecnocrática dominante em cerca de cinco a sete por cento da população. Essas pessoas interagiam umas com as outras diariamente e formavam a entidade coerente que tinha poder real. Eles viviam uma realidade paralela privilegiada, totalmente alijada do mundo ao seu redor, que ditava todos os aspectos da vida em seu próprio benefício – até que um dia isso não aconteceu. Foi essa tecnocracia que entrou em colapso em 1989.

O que causou a queda repentina desses Estados? A resposta curta de Kotkin é uma queda de confiança em cascata: uma “corrida política aos bancos”. E o evento crucial na derrubada de todos os governos comunistas foi o protesto de rua. Assim, os eventos de 1989 surpreenderam totalmente todo o Ocidente devido à falta de oposição política organizada.

O ponto aqui, é claro, é que a tecnocracia europeia de hoje, habitando suas políticas extremas de gênero, diversidade e realidades verdes paralelas (à da maioria dos europeus), presunçosamente assume que com o controle da Narrativa, eles podem suprimir protestos e impor um futuro Fórum Econômico Mundial que apaga identidades e culturas nacionais sem impedimentos.

O que está acontecendo na França – de diversas formas – é precisamente uma “corrida aos bancos política” do presidente francês. E o que está acontecendo na França, no entanto, pode se espalhar…

Claro, protestos de rua em Estados comunistas já aconteceram antes. O que era diferente em 1989, argumenta Kotkin, era a extrema fragilidade do regime. Os dois impulsionadores imediatos – além da simples incompetência e esclerose – foram a recusa de Mikhail Gorbachev (como Macron durante esta recente insurreição) em parar uma repressão, além do fracassado esquema econômico Ponzi em que todos esses Estados se envolveram (empréstimo em moeda forte do Ocidente para sustentar suas economias).

É aqui que podemos entender por que os eventos recentes na França são tão graves e afetam mais amplamente. Pois, perversamente, a Europa está trilhando essencialmente o mesmo caminho (com características ocidentais) que o Leste Europeu trilhou.

No final das duas Guerras Mundiais, os europeus ocidentais buscavam uma sociedade mais justa (a sociedade industrial que precedeu as guerras era francamente feudal e brutal). Os europeus queriam um novo acordo que também cuidasse dos menos favorecidos. Não era o socialismo em si que se buscava, embora alguns claramente desejassem o comunismo. Essencialmente, tratava-se de reinserir alguns valores éticos em uma esfera econômica de laissez-faire amoral.

Não funcionou bem. O sistema cresceu, até que os Estados ocidentais não podiam mais se sustentar. A dívida disparou. E então, na década de 1980, um aparente ‘remédio’ – importado da Escola de Chicago de fanáticos neoliberais, pregando o desgaste da infraestrutura social e a financeirização da economia – foi amplamente adotado.

Os proselitistas de Chicago disseram à PM Thatcher para parar de construir navios ou fabricar carros – isso era para a Ásia. A ‘indústria’ de serviços financeiros era a galinha dos ovos de ouro no futuro.

A cura provou ser ‘pior que a doença’. Paradoxalmente, a falha desse enigma econômico em desenvolvimento foi percebida por Friedrich List e pela Escola Alemã de Economia, já no século XIX. Ele viu a falha no modelo ‘Anglo’ liderado pela dívida e baseado no consumo: que (em poucas palavras) o bem-estar de uma sociedade e sua riqueza geral são determinados não pelo que a sociedade pode comprar, mas pelo que ela pode fazer.

List previu que uma virada para a valorização do consumo – acima de cuidar da construção da economia real – inevitavelmente levaria a uma atenuação da economia real: à medida que o consumo e um efêmero setor financeiro e de serviços sugavam o ‘oxigênio’ de novos investimentos da manufatura da produção real (ainda necessária para pagar as importações), a economia real definharia.

A autossuficiência seria corroída e uma base cada vez menor de criação de riqueza real sustentaria números cada vez menores em empregos adequadamente remunerados. E uma dívida cada vez maior se tornaria necessária para sustentar um grupo cada vez menor de empregados produtivos. Isso representa o ‘Conto da França’.

Nos EUA hoje, por exemplo, os números oficialmente de desempregados são 6,1 milhões de americanos; ainda assim, 99,8 milhões de americanos em idade ativa são considerados “fora da força de trabalho”. Assim, um total de 105 milhões de americanos em idade produtiva não têm emprego hoje.

Esta é a mesma ‘armadilha’ que afeta a França (e grande parte da Europa). A inflação está subindo; a economia real está se contraindo; e o emprego bem remunerado encolhendo – ao mesmo tempo em que o tecido de apoio foi eviscerado (por razões ideológicas).

É sombrio. O aumento da imigração para a Europa agrava o problema. Todos podem ver isso, exceto a Nomenklatura europeia que permanece na negação ideológica da ‘sociedade aberta’.

Aqui está o problema: não há soluções. Desfazer as contradições estruturais desse modelo de Chicago está além das atuais capacidades políticas ocidentais.

A Esquerda não tem solução, e a Direita não pode opinar – Zugzwang (xeque-mate).

O que nos traz de volta ao ‘Conto sobre as Duas Cidades’ e suas experiências de insurgência muito diferentes: Na França, não há solução. Na Rússia, Putin e milhões de outros experimentaram a “terapia de choque” da liberação de preços e do hiperfinanceiro durante os anos Yeltsin.

E Putin ‘entendeu’. Como List previu, o modelo financeirizado ‘Anglo’ corroeu a autossuficiência nacional e encolheu a base da criação real de riqueza, que fornecia os empregos necessários para sustentar a população russa com trabalho.

Muitas pessoas perderam seus empregos durante os anos Yeltsin; não foram pagas; e viram o valor real de seus ganhos despencar – enquanto oligarcas pipocavam aparentemente do ar e vinham saquear qualquer instituição que tivesse valor. Houve hiperinflação, gangsterismo, corrupção, corridas monetárias, fuga de capitais, pobreza desesperadora, aumento do alcoolismo, declínio da saúde e exibições vulgares e esbanjadoras de riqueza por parte dos super-ricos.

No entanto, a principal influência sobre Putin veio do presidente Xi. Este último havia deixado claro, em uma análise contundente intitulada “Por que a União Soviética se desintegrou?”, que o repúdio soviético à história do PCUS de Lênin, de Stálin, “foi destruir ao caos a ideologia soviética e engajar em niilismo histórico”.

Xi argumentou que, dados os dois polos de antinomia ideológica – o da construção anglo-americana, por um lado, e a crítica escatológica leninista do sistema econômico ocidental, por outro – os “estratos dominantes soviéticos deixaram de acreditar” no último e, consequentemente, caíram em um estado de niilismo (com o pivô para a ideologia do mercado liberal ocidental da era Gorbachev-Yeltsin).

O ponto de Xi foi claro: a China nunca havia feito esse desvio. Em termos simples, para Xi, o desastre econômico de Yeltsin foi o resultado da virada para o liberalismo ocidental. E Putin concordou.

Nas palavras de Putin, a China “conseguiu da melhor maneira possível, na minha opinião, usar as alavancas da administração central (para) o desenvolvimento de uma economia de mercado… A União Soviética não fez nada disso, e os resultados de uma política econômica ineficaz impactou a esfera política”.

Mas isso é precisamente o que a Rússia, sob Putin, corrigiu. Misturar a ideologia de Lênin com os insights econômicos de List (um seguidor de List, o conde Sergei Witte foi primeiro-ministro na Rússia do século XIX) tornou a Rússia autossuficiente.

O Ocidente não a vê dessa forma. Este último persiste em ver a Rússia como um Estado frágil e friável, tão em dificuldades financeiras que qualquer reversão na frente de batalha ucraniana poderia provocar um colapso financeiro em pânico (como visto em 1998) e anarquia política em Moscou, semelhante à da era Yeltsin.

Com base nessa análise falha e absurda, o Ocidente lançou uma guerra contra a Rússia via Ucrânia. A estratégia de guerra sempre se baseou na fragilidade política e econômica russa (e em um exército atolado em rígidas estruturas de comando de estilo soviético).

A guerra pode ser atribuída em grande parte a essa falha em entender a forte convicção de Xi e Putin de que a devastação de Yeltsin foi o resultado inevitável da virada para o liberalismo ocidental. E que essa falha exigia uma correção ajustada, o que Putin fez devidamente – mas que o Ocidente não percebeu.

Os EUA, no entanto, persistem, contra as evidências, na convicção de que a fragilidade inerente da Rússia é explicada por seu afastamento das doutrinas econômicas ‘anglo’. Isso reflete a pura ilusão ocidental.

A maioria dos russos, por outro lado, atribui a resiliência da Rússia diante de um ataque financeiro ocidental combinado como explicável, porque Putin, em grande parte, levou a Rússia à autossuficiência, fora da esfera econômica ocidental dominada pelos EUA.

Assim, o paradoxo é explicado: Diante da ‘insurgência’ de Prigozhin, os russos expressaram sua confiança e apoio ao Estado russo. Já na insurgência francesa, o povo expressou descontentamento e raiva pela ‘armadilha’ em que se encontra. A corrida política ao ‘banco’ Macron está em andamento.

Traducao: Comunidad Saker Latinoamerica

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