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Eduardo Vasco
June 20, 2025
© Photo: Public domain

O governo do presidente Lula tem tentado colocar novamente o Brasil em uma posição de soberania e de diálogo com todos os países, sem subordinação a nenhuma nação.

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O deputado Miguel Ângelo, do Partido dos Trabalhadores, esteve em Moscou em 2023 para participar da Conferência Parlamentar Internacional Rússia–América Latina. Ele se impressionou com a normalidade da vida dos cidadãos na capital russa, apesar de, naquela época, já estar havendo um conflito militar com a OTAN no Donbass.

“Moscou é uma cidade muito linda, maravilhosa e limpa. Gostei muito. As demais capitais europeias ficam muito atrás de Moscou. Há muita sujeira nas ruas de Paris e Roma, coisa que não existe em Moscou. De noite também é uma cidade muito iluminada”, conta em entrevista à Strategic Culture Foundation.

Nesta conversa, ele aborda a importância da parceria do Brasil com o BRICS, as relações com Rússia, China e Estados Unidos e a necessidade de uma verdadeira soberania nacional.

Qual deveria ser o papel do BRICS na construção de um Brasil soberano e com justiça social?

Sem dúvida o BRICS tem um papel central na construção da soberania brasileira e na justiça social. O papel do BRICS vai muito além de questões meramente econômicas. Ele tem representado cada vez mais uma alternativa para o Brasil aos tradicionais centros de poder geopolítico. Os tarifaços impostos por Trump deixam ainda mais evidente a necessidade da construção de um mundo mais multipolar para fazer com que o Brasil e os outros países do mundo se tornem menos vulneráveis ao que estamos vendo [com as medidas comerciais unilaterais dos EUA].

O BRICS é composto por países que são mais semelhantes ao nosso e, assim, nos permite, com toda a certeza, atuar em favor dos interesses do Brasil e do Sul Global. Não temos assim os alinhamentos automáticos que antes nos eram impostos e que muitas vezes eram contrários aos interesses do país. É importante destacar o papel que o Novo Banco de Desenvolvimento tem, ao fornecer financiamento de dezenas de milhões de dólares em infraestrutura e desenvolvimento sustentável e que não vem junto com as velhas obrigações impostas pelo sistema financeiro internacional, que muitas vezes são contrários aos interesses do país.

A parceria com a China poderia tirar do papel antigos projetos que, com outros parceiros, o Brasil nunca conseguiu implementar?

Eu estive na China em abril de 2024 com uma delegação do PT, em intercâmbio com o Partido Comunista da China. Me impressionei muito com a capacidade de investimento em infraestrutura. A China tem capacidade de desenvolver esses projetos conjuntos com o Brasil, até porque ela já está fazendo isso com outros países através, principalmente, da Nova Rota da Seda. O Brasil precisa muito de investimento em infraestrutura, como a ferroviária. Esses projetos exigem uma visão e uma estratégia de longo prazo e a China tem demonstrado interesse em prover isso ao Brasil.

A China também pode oferecer ao Brasil um potencial tecnológico enorme. Já tem muito investimento no Brasil nesse sentido, como fábricas automotivas que se instalaram aqui recentemente. Em Minas Gerais, há um forte investimento chinês em energia fotovoltaica e eu acho que essas parcerias precisam ser ampliadas para mais segmentos. Devemos buscar um intercâmbio técnico e tecnológico com a China.

A China poderia realizar a tão sonhada transferência de tecnologia para o Brasil, uma promessa frequente quando nossos sucessivos governos firmam acordos com países como EUA e França mas que nunca ocorreu realmente?

Acredito que sim. Algo que não seja apenas através de investimentos financeiros ou uma aproximação política, mas sim o incentivo ao desenvolvimento da técnica e da tecnologia no Brasil. Por ser um país que sofreu muito tempo com a impossibilidade de desenvolver tecnologias, como a dos microchips, a China não quer o mesmo para os seus parceiros do Sul Global. Ele quer o desenvolvimento tecnológico dos países emergentes.

O presidente Lula esteve em Moscou na Parada Militar do Dia da Vitória, em 9 de Maio. Você já havia estado lá pouco tempo atrás. Qual a sua opinião sobre o papel da Rússia na política internacional e nas relações com a América Latina e o Brasil?

Foi muito corajosa a ida do presidente Lula a Moscou em um momento como esse. Independentemente de qualquer opinião que o mundo possa ter da Rússia, o papel do Brasil é construir pontes mundiais para o diálogo. E isso não ocorre implodindo pontes com a Rússia. A Rússia sempre teve um papel central na geopolítica internacional e esse papel se fortalece cada vez mais nesses últimos anos. É uma potência nuclear, tem um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU e é importante destacar o papel histórico da Rússia na derrota do nazismo na Segunda Guerra Mundial.

As relações estabelecidas com a Rússia, no Brasil e na América Latina, baseiam-se na soberania e na não-interferência em assuntos internos. Isso é muito atraente para nações como o Brasil e as sul-americanas, que sofrem historicamente com intervenções externas.

O governo Bolsonaro se destacou pela relação de subserviência com os Estados Unidos. Acha que isso deixou sequelas até hoje, como projetos muito atrelados à dependência a Washington?

Certamente. Não faz sentido esse alinhamento automático ocorrido nos quatro anos de governo Bolsonaro. Quando se deixa em segundo plano, por exemplo, a relação do Brasil com os BRICS, que hoje são os principais parceiros do Brasil, acaba-se atrasando por muito tempo a integração do Brasil com esses países.

O governo Bolsonaro implementou um desmantelamento dessas importantes estruturas para o Brasil – a cooperação com os BRICS e a cooperação Sul-Sul. Ele atuou de forma ativa para enfraquecer nossa relação com os demais países. Por exemplo, o status de aliado extra-OTAN, alcançado por um acordo entre Bolsonaro e Trump, pode parecer um ganho para o Brasil, mas no final das contas vai afastar outros parceiros militares e tecnológicos que, de fato, trariam algo de positivo para o Brasil. Porque esse alinhamento com os EUA não trouxe nada de positivo para o nosso país.

O governo do presidente Lula tem tentado reverter essa situação e colocar novamente o Brasil em uma posição de soberania e de diálogo com todos os países, sem subordinação a nenhuma nação.

E neste momento, acredita que as relações com os Estados Unidos estão muito tensas? O bolsonarismo ou outros setores da oposição podem utilizar as intromissões de Donald Trump para receber seu apoio nas eleições de 2026?

Eles já estão tentando. A ida do Eduardo Bolsonaro aos EUA não é à toa. É um ataque gigantesco à soberania do Brasil buscar um aliado externo para interferir em questões internas. E, de fato, a volta de Trump à Casa Branca é uma marca dessa tensão entre Brasil e EUA. Mas o presidente Lula tem gerenciado essa situação diplomática, tem evitado alguma espécie de rompimento e buscado o diálogo em todos os momentos. O papel do Brasil no mundo está se impondo às manobras da extrema-direita. A relação com os EUA está tensa, mas acho que não haverá maiores sequelas nas relações até o final do governo Trump.

As eleições de 2026, principalmente se Lula for candidato à reeleição, irão opor os interesses nacionais do Brasil aos interesses estrangeiros?

Elas se encaminham para isso. Será uma disputa entre dois projetos opostos de país e de soberania. De um lado, um projeto que representa o fortalecimento e a soberania do Brasil, o crescimento econômico com justiça social, a redução das desigualdades sociais. De outro, um projeto que representa o alinhamento a interesses que não são os do Brasil e do povo brasileiro, que busca entregar o Brasil e defender o interesse de poucos – que, muitas vezes, nem brasileiros são.

Entrevista: «o alinhamento com os EUA não trouxe nada positivo para o Brasil», diz deputado

O governo do presidente Lula tem tentado colocar novamente o Brasil em uma posição de soberania e de diálogo com todos os países, sem subordinação a nenhuma nação.

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O deputado Miguel Ângelo, do Partido dos Trabalhadores, esteve em Moscou em 2023 para participar da Conferência Parlamentar Internacional Rússia–América Latina. Ele se impressionou com a normalidade da vida dos cidadãos na capital russa, apesar de, naquela época, já estar havendo um conflito militar com a OTAN no Donbass.

“Moscou é uma cidade muito linda, maravilhosa e limpa. Gostei muito. As demais capitais europeias ficam muito atrás de Moscou. Há muita sujeira nas ruas de Paris e Roma, coisa que não existe em Moscou. De noite também é uma cidade muito iluminada”, conta em entrevista à Strategic Culture Foundation.

Nesta conversa, ele aborda a importância da parceria do Brasil com o BRICS, as relações com Rússia, China e Estados Unidos e a necessidade de uma verdadeira soberania nacional.

Qual deveria ser o papel do BRICS na construção de um Brasil soberano e com justiça social?

Sem dúvida o BRICS tem um papel central na construção da soberania brasileira e na justiça social. O papel do BRICS vai muito além de questões meramente econômicas. Ele tem representado cada vez mais uma alternativa para o Brasil aos tradicionais centros de poder geopolítico. Os tarifaços impostos por Trump deixam ainda mais evidente a necessidade da construção de um mundo mais multipolar para fazer com que o Brasil e os outros países do mundo se tornem menos vulneráveis ao que estamos vendo [com as medidas comerciais unilaterais dos EUA].

O BRICS é composto por países que são mais semelhantes ao nosso e, assim, nos permite, com toda a certeza, atuar em favor dos interesses do Brasil e do Sul Global. Não temos assim os alinhamentos automáticos que antes nos eram impostos e que muitas vezes eram contrários aos interesses do país. É importante destacar o papel que o Novo Banco de Desenvolvimento tem, ao fornecer financiamento de dezenas de milhões de dólares em infraestrutura e desenvolvimento sustentável e que não vem junto com as velhas obrigações impostas pelo sistema financeiro internacional, que muitas vezes são contrários aos interesses do país.

A parceria com a China poderia tirar do papel antigos projetos que, com outros parceiros, o Brasil nunca conseguiu implementar?

Eu estive na China em abril de 2024 com uma delegação do PT, em intercâmbio com o Partido Comunista da China. Me impressionei muito com a capacidade de investimento em infraestrutura. A China tem capacidade de desenvolver esses projetos conjuntos com o Brasil, até porque ela já está fazendo isso com outros países através, principalmente, da Nova Rota da Seda. O Brasil precisa muito de investimento em infraestrutura, como a ferroviária. Esses projetos exigem uma visão e uma estratégia de longo prazo e a China tem demonstrado interesse em prover isso ao Brasil.

A China também pode oferecer ao Brasil um potencial tecnológico enorme. Já tem muito investimento no Brasil nesse sentido, como fábricas automotivas que se instalaram aqui recentemente. Em Minas Gerais, há um forte investimento chinês em energia fotovoltaica e eu acho que essas parcerias precisam ser ampliadas para mais segmentos. Devemos buscar um intercâmbio técnico e tecnológico com a China.

A China poderia realizar a tão sonhada transferência de tecnologia para o Brasil, uma promessa frequente quando nossos sucessivos governos firmam acordos com países como EUA e França mas que nunca ocorreu realmente?

Acredito que sim. Algo que não seja apenas através de investimentos financeiros ou uma aproximação política, mas sim o incentivo ao desenvolvimento da técnica e da tecnologia no Brasil. Por ser um país que sofreu muito tempo com a impossibilidade de desenvolver tecnologias, como a dos microchips, a China não quer o mesmo para os seus parceiros do Sul Global. Ele quer o desenvolvimento tecnológico dos países emergentes.

O presidente Lula esteve em Moscou na Parada Militar do Dia da Vitória, em 9 de Maio. Você já havia estado lá pouco tempo atrás. Qual a sua opinião sobre o papel da Rússia na política internacional e nas relações com a América Latina e o Brasil?

Foi muito corajosa a ida do presidente Lula a Moscou em um momento como esse. Independentemente de qualquer opinião que o mundo possa ter da Rússia, o papel do Brasil é construir pontes mundiais para o diálogo. E isso não ocorre implodindo pontes com a Rússia. A Rússia sempre teve um papel central na geopolítica internacional e esse papel se fortalece cada vez mais nesses últimos anos. É uma potência nuclear, tem um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU e é importante destacar o papel histórico da Rússia na derrota do nazismo na Segunda Guerra Mundial.

As relações estabelecidas com a Rússia, no Brasil e na América Latina, baseiam-se na soberania e na não-interferência em assuntos internos. Isso é muito atraente para nações como o Brasil e as sul-americanas, que sofrem historicamente com intervenções externas.

O governo Bolsonaro se destacou pela relação de subserviência com os Estados Unidos. Acha que isso deixou sequelas até hoje, como projetos muito atrelados à dependência a Washington?

Certamente. Não faz sentido esse alinhamento automático ocorrido nos quatro anos de governo Bolsonaro. Quando se deixa em segundo plano, por exemplo, a relação do Brasil com os BRICS, que hoje são os principais parceiros do Brasil, acaba-se atrasando por muito tempo a integração do Brasil com esses países.

O governo Bolsonaro implementou um desmantelamento dessas importantes estruturas para o Brasil – a cooperação com os BRICS e a cooperação Sul-Sul. Ele atuou de forma ativa para enfraquecer nossa relação com os demais países. Por exemplo, o status de aliado extra-OTAN, alcançado por um acordo entre Bolsonaro e Trump, pode parecer um ganho para o Brasil, mas no final das contas vai afastar outros parceiros militares e tecnológicos que, de fato, trariam algo de positivo para o Brasil. Porque esse alinhamento com os EUA não trouxe nada de positivo para o nosso país.

O governo do presidente Lula tem tentado reverter essa situação e colocar novamente o Brasil em uma posição de soberania e de diálogo com todos os países, sem subordinação a nenhuma nação.

E neste momento, acredita que as relações com os Estados Unidos estão muito tensas? O bolsonarismo ou outros setores da oposição podem utilizar as intromissões de Donald Trump para receber seu apoio nas eleições de 2026?

Eles já estão tentando. A ida do Eduardo Bolsonaro aos EUA não é à toa. É um ataque gigantesco à soberania do Brasil buscar um aliado externo para interferir em questões internas. E, de fato, a volta de Trump à Casa Branca é uma marca dessa tensão entre Brasil e EUA. Mas o presidente Lula tem gerenciado essa situação diplomática, tem evitado alguma espécie de rompimento e buscado o diálogo em todos os momentos. O papel do Brasil no mundo está se impondo às manobras da extrema-direita. A relação com os EUA está tensa, mas acho que não haverá maiores sequelas nas relações até o final do governo Trump.

As eleições de 2026, principalmente se Lula for candidato à reeleição, irão opor os interesses nacionais do Brasil aos interesses estrangeiros?

Elas se encaminham para isso. Será uma disputa entre dois projetos opostos de país e de soberania. De um lado, um projeto que representa o fortalecimento e a soberania do Brasil, o crescimento econômico com justiça social, a redução das desigualdades sociais. De outro, um projeto que representa o alinhamento a interesses que não são os do Brasil e do povo brasileiro, que busca entregar o Brasil e defender o interesse de poucos – que, muitas vezes, nem brasileiros são.

O governo do presidente Lula tem tentado colocar novamente o Brasil em uma posição de soberania e de diálogo com todos os países, sem subordinação a nenhuma nação.

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O deputado Miguel Ângelo, do Partido dos Trabalhadores, esteve em Moscou em 2023 para participar da Conferência Parlamentar Internacional Rússia–América Latina. Ele se impressionou com a normalidade da vida dos cidadãos na capital russa, apesar de, naquela época, já estar havendo um conflito militar com a OTAN no Donbass.

“Moscou é uma cidade muito linda, maravilhosa e limpa. Gostei muito. As demais capitais europeias ficam muito atrás de Moscou. Há muita sujeira nas ruas de Paris e Roma, coisa que não existe em Moscou. De noite também é uma cidade muito iluminada”, conta em entrevista à Strategic Culture Foundation.

Nesta conversa, ele aborda a importância da parceria do Brasil com o BRICS, as relações com Rússia, China e Estados Unidos e a necessidade de uma verdadeira soberania nacional.

Qual deveria ser o papel do BRICS na construção de um Brasil soberano e com justiça social?

Sem dúvida o BRICS tem um papel central na construção da soberania brasileira e na justiça social. O papel do BRICS vai muito além de questões meramente econômicas. Ele tem representado cada vez mais uma alternativa para o Brasil aos tradicionais centros de poder geopolítico. Os tarifaços impostos por Trump deixam ainda mais evidente a necessidade da construção de um mundo mais multipolar para fazer com que o Brasil e os outros países do mundo se tornem menos vulneráveis ao que estamos vendo [com as medidas comerciais unilaterais dos EUA].

O BRICS é composto por países que são mais semelhantes ao nosso e, assim, nos permite, com toda a certeza, atuar em favor dos interesses do Brasil e do Sul Global. Não temos assim os alinhamentos automáticos que antes nos eram impostos e que muitas vezes eram contrários aos interesses do país. É importante destacar o papel que o Novo Banco de Desenvolvimento tem, ao fornecer financiamento de dezenas de milhões de dólares em infraestrutura e desenvolvimento sustentável e que não vem junto com as velhas obrigações impostas pelo sistema financeiro internacional, que muitas vezes são contrários aos interesses do país.

A parceria com a China poderia tirar do papel antigos projetos que, com outros parceiros, o Brasil nunca conseguiu implementar?

Eu estive na China em abril de 2024 com uma delegação do PT, em intercâmbio com o Partido Comunista da China. Me impressionei muito com a capacidade de investimento em infraestrutura. A China tem capacidade de desenvolver esses projetos conjuntos com o Brasil, até porque ela já está fazendo isso com outros países através, principalmente, da Nova Rota da Seda. O Brasil precisa muito de investimento em infraestrutura, como a ferroviária. Esses projetos exigem uma visão e uma estratégia de longo prazo e a China tem demonstrado interesse em prover isso ao Brasil.

A China também pode oferecer ao Brasil um potencial tecnológico enorme. Já tem muito investimento no Brasil nesse sentido, como fábricas automotivas que se instalaram aqui recentemente. Em Minas Gerais, há um forte investimento chinês em energia fotovoltaica e eu acho que essas parcerias precisam ser ampliadas para mais segmentos. Devemos buscar um intercâmbio técnico e tecnológico com a China.

A China poderia realizar a tão sonhada transferência de tecnologia para o Brasil, uma promessa frequente quando nossos sucessivos governos firmam acordos com países como EUA e França mas que nunca ocorreu realmente?

Acredito que sim. Algo que não seja apenas através de investimentos financeiros ou uma aproximação política, mas sim o incentivo ao desenvolvimento da técnica e da tecnologia no Brasil. Por ser um país que sofreu muito tempo com a impossibilidade de desenvolver tecnologias, como a dos microchips, a China não quer o mesmo para os seus parceiros do Sul Global. Ele quer o desenvolvimento tecnológico dos países emergentes.

O presidente Lula esteve em Moscou na Parada Militar do Dia da Vitória, em 9 de Maio. Você já havia estado lá pouco tempo atrás. Qual a sua opinião sobre o papel da Rússia na política internacional e nas relações com a América Latina e o Brasil?

Foi muito corajosa a ida do presidente Lula a Moscou em um momento como esse. Independentemente de qualquer opinião que o mundo possa ter da Rússia, o papel do Brasil é construir pontes mundiais para o diálogo. E isso não ocorre implodindo pontes com a Rússia. A Rússia sempre teve um papel central na geopolítica internacional e esse papel se fortalece cada vez mais nesses últimos anos. É uma potência nuclear, tem um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU e é importante destacar o papel histórico da Rússia na derrota do nazismo na Segunda Guerra Mundial.

As relações estabelecidas com a Rússia, no Brasil e na América Latina, baseiam-se na soberania e na não-interferência em assuntos internos. Isso é muito atraente para nações como o Brasil e as sul-americanas, que sofrem historicamente com intervenções externas.

O governo Bolsonaro se destacou pela relação de subserviência com os Estados Unidos. Acha que isso deixou sequelas até hoje, como projetos muito atrelados à dependência a Washington?

Certamente. Não faz sentido esse alinhamento automático ocorrido nos quatro anos de governo Bolsonaro. Quando se deixa em segundo plano, por exemplo, a relação do Brasil com os BRICS, que hoje são os principais parceiros do Brasil, acaba-se atrasando por muito tempo a integração do Brasil com esses países.

O governo Bolsonaro implementou um desmantelamento dessas importantes estruturas para o Brasil – a cooperação com os BRICS e a cooperação Sul-Sul. Ele atuou de forma ativa para enfraquecer nossa relação com os demais países. Por exemplo, o status de aliado extra-OTAN, alcançado por um acordo entre Bolsonaro e Trump, pode parecer um ganho para o Brasil, mas no final das contas vai afastar outros parceiros militares e tecnológicos que, de fato, trariam algo de positivo para o Brasil. Porque esse alinhamento com os EUA não trouxe nada de positivo para o nosso país.

O governo do presidente Lula tem tentado reverter essa situação e colocar novamente o Brasil em uma posição de soberania e de diálogo com todos os países, sem subordinação a nenhuma nação.

E neste momento, acredita que as relações com os Estados Unidos estão muito tensas? O bolsonarismo ou outros setores da oposição podem utilizar as intromissões de Donald Trump para receber seu apoio nas eleições de 2026?

Eles já estão tentando. A ida do Eduardo Bolsonaro aos EUA não é à toa. É um ataque gigantesco à soberania do Brasil buscar um aliado externo para interferir em questões internas. E, de fato, a volta de Trump à Casa Branca é uma marca dessa tensão entre Brasil e EUA. Mas o presidente Lula tem gerenciado essa situação diplomática, tem evitado alguma espécie de rompimento e buscado o diálogo em todos os momentos. O papel do Brasil no mundo está se impondo às manobras da extrema-direita. A relação com os EUA está tensa, mas acho que não haverá maiores sequelas nas relações até o final do governo Trump.

As eleições de 2026, principalmente se Lula for candidato à reeleição, irão opor os interesses nacionais do Brasil aos interesses estrangeiros?

Elas se encaminham para isso. Será uma disputa entre dois projetos opostos de país e de soberania. De um lado, um projeto que representa o fortalecimento e a soberania do Brasil, o crescimento econômico com justiça social, a redução das desigualdades sociais. De outro, um projeto que representa o alinhamento a interesses que não são os do Brasil e do povo brasileiro, que busca entregar o Brasil e defender o interesse de poucos – que, muitas vezes, nem brasileiros são.

The views of individual contributors do not necessarily represent those of the Strategic Culture Foundation.

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