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Raphael Machado
September 1, 2024
© Photo: articulo66.com

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Essa semana, o governo da Nicarágua baniu mais de 1.500 Organizações Não Governamentais de vários tipos e deu início aos procedimentos legais necessários para garantir o confisco das propriedades dessas ONGs.

A medida tem sido tratada pela mídia de massa internacional como uma decisão unilateral de Daniel Ortega, pintado como “ditador”, em uma suposta investida contra a “sociedade civil”. Mas ela é apenas o fruto da aplicação ordinária de leis cuja aprovação e adoção se deu nos termos do ordenamento jurídico da Nicarágua, como a Lei de Regulação de Agentes Estrangeiros (Lei nº 1040 de 2020), e a Lei Geral de Regulação e Controle de Organismos Sem Fins Lucrativos (Lei nº 1115 de 2022), as quais impõem uma série de obrigações às ONGs, especialmente no que concerne natureza de atividades e necessidade de prestação de contas, sob pena de encerramento compulsório das atividades.

É difícil, portanto, falar em “perseguição” nesses casos específicos, e o drama gerado pela notícia do banimento das ONGs só existe porque as partes interessadas se sentem afetadas pelo encerramento das suas atividades.

Esse enfrentamento do governo nicaraguense às ONGs e outros tipos de organizações estrangeiras teve como ponto de partida o ano de 2018 e os protestos que desestabilizaram o país entre abril e julho daquele ano. As manifestações seguiram a lógica das revoluções coloridas, no que concerne o seu modelo de organização e viralização entre diferentes setores sociais, e apesar de começarem por conta de uma reforma do sistema previdenciário culminaram na exigência de renúncia de Ortega.

As manifestações, nas quais houve também recurso a um nível de violência que resultou em centenas de mortes, foram interpretadas pelo Estado como “tentativa de golpe de Estado” e, a partir de então, todas as associações que tiveram algum tipo de participação na organização ou mobilização de pessoas para participar nessas manifestações passaram a ser vistas com suspeita.

Daniel Ortega, à época, denunciou que os protestos foram orquestrados por pessoas que haviam sido profissionalmente treinadas em agitação política pela União Europeia e pelos EUA através de ONGs de “direitos humanos”, “jornalismo independente”, “feminismo” etc.

Nesse sentido, os eventos na Nicarágua seguiram um modus operandi bastante típico, por exemplo, do Maidan ou da Primavera Árabe, em que os mesmos tipos de atores são utilizados como ferramentas de doutrinação, manipulação e treinamento de cidadãos para que tentem desestabilizar o governo do próprio raiz a partir de manifestações justificadas por princípios e crenças liberais que estariam sendo violados.

É claro que, se o enfrentamento às ONGs tem sido uma constante nos processos soberanistas contra-hegemônicos ao redor do mundo, a partir do reconhecimento do papel que esses instrumentos têm na estratégia de hegemonia planetária unipolar, o caso da Nicarágua apresenta também contornos polêmicos por causa da questão religiosa.

É que muitas das ONGs fechadas pelo governo de Ortega desde 2018 são instituições religiosas, tanto católicas quanto evangélicas, ou associações pararreligiosas, como rádios, universidades, etc.

A história das relações entre a Revolução Sandinista e as organizações religiosas é complexa. Na época do processo revolucionário, uma parte da hierarquia católica ainda apoiava a ditadura de Somoza, enquanto uma outra parte do clero, em alguma medida influenciada pela Teologia da Libertação, apoiava os sandinistas.

O primeiro governo Ortega chegou, inclusive, a ter padres entre seus ministros, o que foi duramente repreendido pelo Papa João Paulo II pelo caráter supostamente socialista do governo sandinista.

Nesse sentido, a questão religiosa nicaraguense é definida pelas tensões entre um catolicismo popular, uma hierarquia que às vezes tende ao governo sandinista, às vezes tende à oposição e, um movimento evangélico de raízes estadunidenses tentando aproveitar as tensões com o catolicismo para crescer.

Precisamente por causa da tentativa de revolução colorida em 2018 e da suspeita de que algumas associações religiosas teriam tido participação, chegou-se a uma situação de extrema tensão entre a Nicarágua e o Vaticano, com diversas prisões e expulsões de diversos membros do clero.

Nesse sentido, ainda que seja possível compreender as apreensões do governo da Nicarágua pela possível instrumentalização de espaços e recursos de instituições católicas por forças subversivas antinacionais, é necessário o desenvolvimento de uma estratégia prudente para lidar com esse tipo de problema.

Uma consequência imprevista de não abordar essa controvérsia com a necessária delicadeza é que o vácuo deixado pela Igreja Católica e suas associações seja preenchido por seitas neopentecostais com vínculos diretos ou indiretos com o atlantismo e com o sionismo, como tem acontecido em boa parte da América Ibérica.

A controversa luta da Nicarágua contra a ingerência estrangeira

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Essa semana, o governo da Nicarágua baniu mais de 1.500 Organizações Não Governamentais de vários tipos e deu início aos procedimentos legais necessários para garantir o confisco das propriedades dessas ONGs.

A medida tem sido tratada pela mídia de massa internacional como uma decisão unilateral de Daniel Ortega, pintado como “ditador”, em uma suposta investida contra a “sociedade civil”. Mas ela é apenas o fruto da aplicação ordinária de leis cuja aprovação e adoção se deu nos termos do ordenamento jurídico da Nicarágua, como a Lei de Regulação de Agentes Estrangeiros (Lei nº 1040 de 2020), e a Lei Geral de Regulação e Controle de Organismos Sem Fins Lucrativos (Lei nº 1115 de 2022), as quais impõem uma série de obrigações às ONGs, especialmente no que concerne natureza de atividades e necessidade de prestação de contas, sob pena de encerramento compulsório das atividades.

É difícil, portanto, falar em “perseguição” nesses casos específicos, e o drama gerado pela notícia do banimento das ONGs só existe porque as partes interessadas se sentem afetadas pelo encerramento das suas atividades.

Esse enfrentamento do governo nicaraguense às ONGs e outros tipos de organizações estrangeiras teve como ponto de partida o ano de 2018 e os protestos que desestabilizaram o país entre abril e julho daquele ano. As manifestações seguiram a lógica das revoluções coloridas, no que concerne o seu modelo de organização e viralização entre diferentes setores sociais, e apesar de começarem por conta de uma reforma do sistema previdenciário culminaram na exigência de renúncia de Ortega.

As manifestações, nas quais houve também recurso a um nível de violência que resultou em centenas de mortes, foram interpretadas pelo Estado como “tentativa de golpe de Estado” e, a partir de então, todas as associações que tiveram algum tipo de participação na organização ou mobilização de pessoas para participar nessas manifestações passaram a ser vistas com suspeita.

Daniel Ortega, à época, denunciou que os protestos foram orquestrados por pessoas que haviam sido profissionalmente treinadas em agitação política pela União Europeia e pelos EUA através de ONGs de “direitos humanos”, “jornalismo independente”, “feminismo” etc.

Nesse sentido, os eventos na Nicarágua seguiram um modus operandi bastante típico, por exemplo, do Maidan ou da Primavera Árabe, em que os mesmos tipos de atores são utilizados como ferramentas de doutrinação, manipulação e treinamento de cidadãos para que tentem desestabilizar o governo do próprio raiz a partir de manifestações justificadas por princípios e crenças liberais que estariam sendo violados.

É claro que, se o enfrentamento às ONGs tem sido uma constante nos processos soberanistas contra-hegemônicos ao redor do mundo, a partir do reconhecimento do papel que esses instrumentos têm na estratégia de hegemonia planetária unipolar, o caso da Nicarágua apresenta também contornos polêmicos por causa da questão religiosa.

É que muitas das ONGs fechadas pelo governo de Ortega desde 2018 são instituições religiosas, tanto católicas quanto evangélicas, ou associações pararreligiosas, como rádios, universidades, etc.

A história das relações entre a Revolução Sandinista e as organizações religiosas é complexa. Na época do processo revolucionário, uma parte da hierarquia católica ainda apoiava a ditadura de Somoza, enquanto uma outra parte do clero, em alguma medida influenciada pela Teologia da Libertação, apoiava os sandinistas.

O primeiro governo Ortega chegou, inclusive, a ter padres entre seus ministros, o que foi duramente repreendido pelo Papa João Paulo II pelo caráter supostamente socialista do governo sandinista.

Nesse sentido, a questão religiosa nicaraguense é definida pelas tensões entre um catolicismo popular, uma hierarquia que às vezes tende ao governo sandinista, às vezes tende à oposição e, um movimento evangélico de raízes estadunidenses tentando aproveitar as tensões com o catolicismo para crescer.

Precisamente por causa da tentativa de revolução colorida em 2018 e da suspeita de que algumas associações religiosas teriam tido participação, chegou-se a uma situação de extrema tensão entre a Nicarágua e o Vaticano, com diversas prisões e expulsões de diversos membros do clero.

Nesse sentido, ainda que seja possível compreender as apreensões do governo da Nicarágua pela possível instrumentalização de espaços e recursos de instituições católicas por forças subversivas antinacionais, é necessário o desenvolvimento de uma estratégia prudente para lidar com esse tipo de problema.

Uma consequência imprevista de não abordar essa controvérsia com a necessária delicadeza é que o vácuo deixado pela Igreja Católica e suas associações seja preenchido por seitas neopentecostais com vínculos diretos ou indiretos com o atlantismo e com o sionismo, como tem acontecido em boa parte da América Ibérica.

Escreva para nós: info@strategic-culture.su

Essa semana, o governo da Nicarágua baniu mais de 1.500 Organizações Não Governamentais de vários tipos e deu início aos procedimentos legais necessários para garantir o confisco das propriedades dessas ONGs.

A medida tem sido tratada pela mídia de massa internacional como uma decisão unilateral de Daniel Ortega, pintado como “ditador”, em uma suposta investida contra a “sociedade civil”. Mas ela é apenas o fruto da aplicação ordinária de leis cuja aprovação e adoção se deu nos termos do ordenamento jurídico da Nicarágua, como a Lei de Regulação de Agentes Estrangeiros (Lei nº 1040 de 2020), e a Lei Geral de Regulação e Controle de Organismos Sem Fins Lucrativos (Lei nº 1115 de 2022), as quais impõem uma série de obrigações às ONGs, especialmente no que concerne natureza de atividades e necessidade de prestação de contas, sob pena de encerramento compulsório das atividades.

É difícil, portanto, falar em “perseguição” nesses casos específicos, e o drama gerado pela notícia do banimento das ONGs só existe porque as partes interessadas se sentem afetadas pelo encerramento das suas atividades.

Esse enfrentamento do governo nicaraguense às ONGs e outros tipos de organizações estrangeiras teve como ponto de partida o ano de 2018 e os protestos que desestabilizaram o país entre abril e julho daquele ano. As manifestações seguiram a lógica das revoluções coloridas, no que concerne o seu modelo de organização e viralização entre diferentes setores sociais, e apesar de começarem por conta de uma reforma do sistema previdenciário culminaram na exigência de renúncia de Ortega.

As manifestações, nas quais houve também recurso a um nível de violência que resultou em centenas de mortes, foram interpretadas pelo Estado como “tentativa de golpe de Estado” e, a partir de então, todas as associações que tiveram algum tipo de participação na organização ou mobilização de pessoas para participar nessas manifestações passaram a ser vistas com suspeita.

Daniel Ortega, à época, denunciou que os protestos foram orquestrados por pessoas que haviam sido profissionalmente treinadas em agitação política pela União Europeia e pelos EUA através de ONGs de “direitos humanos”, “jornalismo independente”, “feminismo” etc.

Nesse sentido, os eventos na Nicarágua seguiram um modus operandi bastante típico, por exemplo, do Maidan ou da Primavera Árabe, em que os mesmos tipos de atores são utilizados como ferramentas de doutrinação, manipulação e treinamento de cidadãos para que tentem desestabilizar o governo do próprio raiz a partir de manifestações justificadas por princípios e crenças liberais que estariam sendo violados.

É claro que, se o enfrentamento às ONGs tem sido uma constante nos processos soberanistas contra-hegemônicos ao redor do mundo, a partir do reconhecimento do papel que esses instrumentos têm na estratégia de hegemonia planetária unipolar, o caso da Nicarágua apresenta também contornos polêmicos por causa da questão religiosa.

É que muitas das ONGs fechadas pelo governo de Ortega desde 2018 são instituições religiosas, tanto católicas quanto evangélicas, ou associações pararreligiosas, como rádios, universidades, etc.

A história das relações entre a Revolução Sandinista e as organizações religiosas é complexa. Na época do processo revolucionário, uma parte da hierarquia católica ainda apoiava a ditadura de Somoza, enquanto uma outra parte do clero, em alguma medida influenciada pela Teologia da Libertação, apoiava os sandinistas.

O primeiro governo Ortega chegou, inclusive, a ter padres entre seus ministros, o que foi duramente repreendido pelo Papa João Paulo II pelo caráter supostamente socialista do governo sandinista.

Nesse sentido, a questão religiosa nicaraguense é definida pelas tensões entre um catolicismo popular, uma hierarquia que às vezes tende ao governo sandinista, às vezes tende à oposição e, um movimento evangélico de raízes estadunidenses tentando aproveitar as tensões com o catolicismo para crescer.

Precisamente por causa da tentativa de revolução colorida em 2018 e da suspeita de que algumas associações religiosas teriam tido participação, chegou-se a uma situação de extrema tensão entre a Nicarágua e o Vaticano, com diversas prisões e expulsões de diversos membros do clero.

Nesse sentido, ainda que seja possível compreender as apreensões do governo da Nicarágua pela possível instrumentalização de espaços e recursos de instituições católicas por forças subversivas antinacionais, é necessário o desenvolvimento de uma estratégia prudente para lidar com esse tipo de problema.

Uma consequência imprevista de não abordar essa controvérsia com a necessária delicadeza é que o vácuo deixado pela Igreja Católica e suas associações seja preenchido por seitas neopentecostais com vínculos diretos ou indiretos com o atlantismo e com o sionismo, como tem acontecido em boa parte da América Ibérica.

The views of individual contributors do not necessarily represent those of the Strategic Culture Foundation.

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