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Os brasileiros aprenderam desde cedo a lutar contra a opressão imperialista. Desde que nossa gente foi formada, pela miscigenação de diversos povos, particularmente o português, o indígena e o negro do sudoeste africano, alcançando, portanto, um nível embrionário de consciência nacional, foram realizadas tentativas de libertar o país do jugo colonial.
Quando da conquista da nossa independência, D. Pedro I musicou os seguintes versos, escritos por Evaristo da Veiga: “Os grilhões que nos forjavam / Da perfídia astuto ardil / Houve mão mais poderosa / Zombou deles o Brasil” que foram seguidos pelo chamado: “Brava gente brasileira / Longe vá temor servil / Ou ficar a Pátria livre / Ou morrer pelo Brasil!”
A necessidade de independência, contudo, não foi plenamente satisfeita. As mãos poderosas de Portugal foram substituídas pelas ainda mais poderosas da Inglaterra e, depois, pelas dos Estados Unidos. Apesar da independência formal – e de importância fundamental –, as potências imperialistas continuaram a nos assediar.
No início do século XX os EUA começaram a dominar economicamente o Brasil. A vitória na I Guerra Mundial expandiu esse domínio, que estava inserido no cenário de conquista econômica, política e inclusive militar sobre toda a América Latina. Foi nessa época que surgiu o primeiro movimento revolucionário moderno contra o imperialismo americano, a Aliança Nacional Libertadora.
O Brasil vivia uma situação de agitações sociais, com a grande greve geral de 1917 e a posterior fundação do Partido Comunista, as inúmeras revoltas do baixo escalão militar, inclusive a mini guerra civil de 1924, a Coluna Prestes, a Revolução de 1930 e uma nova mini guerra civil em 1932. O papel dos tenentes na luta popular fez com que tivessem protagonismo também na ANL, o que foi facilitado pelo domínio do PCB pelo stalinismo soviético.
Como o tenentismo, em meados da década de 30, já era um fenômeno em declínio, e como a política externa da URSS oscilava entre colocar o movimento operário a reboque da burguesia e a luta pela revolução imediata, o Levante de 1935 foi um fracasso.
Aqui interessa primordialmente a análise da política errática levada a cabo por aqueles que pretendiam libertar o Brasil do jugo imperialista. Os militares de baixa patente, como uma camada burocrática inferior da pequena burguesia ligada ao Estado, não tinham logicamente uma formação política adequada, portanto suas ideias revolucionárias eram heterogêneas, superficiais e limitadas.
O PCB, como um partido surgido do âmago da classe operária, e que se pretendia marxista, era, portanto, a vanguarda desse movimento. Contudo, a interpretação distorcida de seus dirigentes sobre o Brasil e a revolução brasileira e a sua subordinação cada vez maior às imposições da Internacional Comunista aparelhada por Stálin não lhe permitiram adotar uma política acertada na condução dessa revolução.
É de destaque fundamental a crença do PCB e da ANL no papel revolucionário das classes dominantes nacionais. No período imediatamente anterior ao Levante de 1935, o PCB chamava a uma “frente única de todos os estudantes, intelectuais, trabalhadores, soldados e marinheiros” (grifo meu), o que é problemático, uma vez que, particularmente entre os intelectuais, a maioria era de membros ou funcionários das classes dominantes. Em seguida, precisamente os intelectuais aderiram a uma frente de massas do PCB “sem distinção de credos políticos”, abrindo o caminho para a evidente infiltração de uma política contrarrevolucionária no movimento.
Em outros documentos, o PCB e a Internacional Comunista falavam em uma “ampla frente única” e na “mais ampla frente anti-imperialista” no Brasil. Era um sintoma da política zigue-zagueante da direção soviética, que ora adotava uma postura sectária contra a social-democracia, ora convidava a burguesia não apenas para se juntar à frente, mas até mesmo para dirigi-la (como ocorreu em seguida na Espanha). Aquele convite a todos os intelectuais também era expressão dessa política confusa e oportunista, porque na virada da década de 1920 para a de 1930 o PCB havia aderido ao “obreirismo”, expulsando os intelectuais do partido e acusando-os de serviçais da burguesia.
Até mesmo o Comitê de São Paulo do PCB, considerado mais avançado, defendia uma frente única “sem distinção de tendências políticas” e os comunicados do partido chamavam para uma assembleia popular contra o projeto da Lei de Segurança Nacional “os oficiais do Exército, da Marinha, da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros, os pequenos comerciantes e industriais” (grifos meus). Isto é, para a luta pela libertação nacional já estavam sendo convidados até mesmo os principais responsáveis pela escravização do povo, o alto escalão das Forças Armadas e a PM, o chicote utilizado pelo imperialismo contra os brasileiros.
Não pode haver nenhuma dúvida sobre a oficialidade dessa política, uma vez que foi explicitada em um documento da própria direção nacional da ANL, intitulado “O Governo Popular Nacional Revolucionário e seu Programa”:
“(…) Esse governo não será somente um governo de operários e camponeses, mas um governo no qual estejam representadas todas as camadas sociais e todas as correntes importantes, ponderáveis, da opinião nacional. Será um governo POPULAR (…) (grifos meus)
O documento enfatizava, outra vez: no novo governo “deverão estar representadas todas as camadas sociais, inclusive a burguesia nacional pelos seus elementos realmente anti-imperialistas e antifascistas” (grifo meu). Mesmo que estourasse um movimento revolucionário, seria muito improvável a sua vitória tendo uma direção política que, ao invés de combater os oficiais das Forças Armadas, convidava-os para fazer a revolução e libertar o país, bem como a própria burguesia nacional. A Espanha comprovaria que essa crença leva à supressão do movimento revolucionário e de libertação nacional pelos mesmos generais e burgueses. A ditadura do Estado Novo e posteriormente do golpe de 1964 reforçariam essa evidência.
* Todas as citações entre aspas têm como fonte a obra “Luiz Carlos Prestes e a Aliança Nacional Libertadora” (PRESTES, Anita Leocádia)